Notícias do Movimento Espírita Araçatuba, SP, quinta-feira, 12 de julho de 2012 Compiladas por Ismael Gobbo |
Agradecemos àqueles que gentilmente repassam este email |
Nota 1 |
Recomendamos confirmar junto aos organizadores os eventos aqui divulgados. Podem ocorrer cancelamentos ou mudanças que nem sempre chegam ao nosso conhecimento. |
Nota 2 |
Este email é uma forma alternativa de divulgação de noticias, eventos, entrevistas e artigos espíritas. Recebemos as informações de fontes diversas e fazemos o repasse aos destinatários de nossa lista de contatos. Trabalhamos com a expectativa de que as informações que nos chegam sejam absolutamente espíritas na forma como preconiza o codificador do Espiritismo, Allan Kardec. Pedimos aos nossos diletos colaboradores que façam uma análise criteriosa e só nos remetam para divulgação matérias genuinamente espíritas. (Ismael Gobbo)
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Atenção |
Se você tiver dificuldades em abrir o arquivo, recebê-lo incompleto ou cortado e fotos que não abrem, clique aqui: http://www.noticiasespiritas.com.br/2012/JULHO/12-07-2012.htm
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Email especial comemorativo dos 110 anos de Jésus Gonçalves Borebi, SP, 12/07/1902 – Pirapitingui (Itu, SP) 16/02/1947 |
Abaixo reproduzimos matérias que já publicamos em emails anteriores relembrando a vida e a obra deste vulto singular e inesquecível ao movimento espírita. Daremos prosseguimento à tarefa publicando outras manifestações que nos chegarem para tal fim. Ismael Gobbo. |
Hoje, aniversário de 110 anos de Jésus Gonçalves. Nossos parabéns ao “Apóstolo de Pirapitingui”, o “Poeta das Chagas Redentoras” |
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Ismael Gobbo
Jésus Gonçalves
Jésus Gonçalves é um vulto respeitado e homenageado no movimento espírita e muitas são as instituições e iniciativas que levam o seu nome. Nasceu em Borebi, SP, e foi batizado como “Jesus*” aos 12 de julho de 1902. Segundo Eduardo Carvalho Monteiro, foi ele, depois de desencarnado, quem pediu que seu nome fosse grafado como Jésus Gonçalves, pois se considerava indigno de ostentar o mesmo nome do Rabi da Galiléia. A vida de Jésus foi marcada por provas acerbas desde a mais tenra idade. Ficou órfão da mãe Josepha Mendes aos três anos; foi morar com um tio na cidade de Agudos e depois em Borebi, onde, aos 14, enfrentou a dura faina de trabalhador rural. Perdeu o pai João Gonçalves em 1917 e em 1919 mudou-se para Bauru onde passou a trabalhar na tesouraria da prefeitura e participar da banda da cidade. Em 1920 casa-se com a viúva e mãe de 2 filhos Theodomira de Oliveira que lhe daria mais quatro rebentos. Tudo caminhava em clima de normalidade até o ano de 1930 quando sofreu dois duros golpes: é diagnosticado como portador da hanseníase e perde a esposa. Aposenta-se e leva a vida na companhia dos 6 filhos até se unir maritalmente a dona Anita Vilela, um anjo bom em sua vida. Para não ser recolhido de imediato a um estabelecimento destinado aos leprosos, seu compadre João Martins Coube leva-o para viver com a familia em sua propriedade rural onde pelo trabalho duro retirava o pão de cada dia. Mas, a doença insidiosa não lhe dá trégua, agrava-se, exige mais cuidados e, retira-lhe abruptamente do convívio social e familiar. No dia 16 de agosto de 1933 é internado no Asilo-Colônia de Aymorés, em Bauru, SP, destinado ao tratamento de leprosos. Jésus e o filho Jaime, também suspeito da doença passam a morar nessa colônia. Fato digno de nota é a mulher Anita, saudável, ter pleiteado e depois de longa luta junto aos órgãos do governo, ter a permissão para ir morar com Jésus naquele leprosário. Mesmo revoltado com a vida e com Deus – costumava dizer-se ateu – Jésus levou sua contribuição aos seus companheiros de infortúnio. Inteligente, transferiu seus dotes do teatro, do jornalismo, da musica e de poesia para proporcionar um pouco de alegria àquelas criaturas presas à solidão e ao abandono. Criou a “Jazz Band de Aymorés” onde tocava clarineta; fundou o jornal O Momento;o Grupo de Balé e de Teatro. No ano de 1937 buscando um melhor tratamento para si, Jésus Gonçalves parte com destino a Guarulhos, SP, visando internar-se no hospital Padre Bento que gozava de grande conceito para tratamentos da espécie. Todavia em plena viagem sente o agravamento de suas dores no fígado e é obrigado a fazer uma parada para descanso no hospital Pirapitingui, em Itu, SP., que também atendia leprosos. Ali permaneceu e levou avante tudo o que já fizera em Aymorés, inclusive montando uma emissora de rádio Idealista mas revoltado ao extremo não dava atenção às palavras de Ninita, uma médium espírita também doente que buscava consolar o seu espírito endurecido, até que no dia 3 de março de 1943 um fato inusitado aconteceu. Durante o velório de sua mulher Anita, esta, utilizando-se de uma médium presente lhe transmite uma mensagem dizendo entre outras palavras carinhosas: “Velho, não duvides mais. Deus existe! A partir daí e com outros acontecimentos que se sucederam, Jésus Gonçalves se converte ao Espiritismo. Consorcia-se com Ninita e funda aos 16 de dezembro de 1945 a Sociedade Espírita Santo Agostinho, com autorização da direção do hospital . O trabalho de Jésus ganha expressão nacional e começa a receber caravanas e mais caravanas de visitantes de todo Brasil que vem participar dos seus trabalhos e prestar solidariedade a todos àqueles que mesmo em meio ao sofrimento começaram a viver uma nova realidade. Jésus, desencarnou aos 16 de fevereiro de 1947 e naquele mesmo mês se apresentou a Chico Xavier, em Pedro Leopoldo, MG, cumprindo promessa que a ele fizera através das cartas expedidas de Pirapitingui. Tanto através de Chico como por Divaldo Pereira Franco se tem noticia de que Jésus Gonçalves em passado distante fora o conquistador Alarico I, rei dos visigodos. Ao final de uma das comunicações através de Chico Xavier a identificação: Alarico, o leproso, - Jésus, o rei... Não por acaso, Jésus Gonçalves é conhecido no meio espírita como “O poeta das chagas redentoras” ou “O apóstolo de Pirapitingui”. Concluindo o intróito deste email de Noticias do Movimento Espirita, totalmente dedicado a Jésus Gonçalves, reproduzimos a parte final do comentário de Herculano Pires, um dos seus visitantes de Pirapitingui, a real importância da Doutrina Espírita para a existência redentora e luminosa de Jésus Gonçalves. “... Mas, direi apenas que o Espiritismo, se nenhuma conversão real tivesse até hoje produzido, nenhum benefício tivesse ainda prestado à humanidade, só com esta maravilhosa transformação de um poeta leproso, far-se-ia digno da admiração e respeito de todas as consciências capazes de compreender as angústias humanas”.
Vista parcial de Borebi, SP, cidade onde nasceu Jésus Gonçalves Fonte da Imagem: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Borebi_020308_REFON_16.JPG |
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O jornalista e historiador Jaime Prado Bauru, SP |
Inscrição sobre o arco de ingresso ao cemitério do Asilo-colônia Aimorés, inaugurado em 1933. Bauru, SP. A inscrição: “Aqui termina as dores da vida” |
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Portão de entrada do Parlatório no Asilo-colônia Aimorés, em Bauru, SP. Foto do acervo particular de Jaime Prado. |
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Asilo-colônia de Aimorés, Bauru, SP, em 1937 |
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VEJA MAIS SOBRE O ASILO-COLÔNIA AYMORÉS:
FOTOS http://www.youtube.com/watch?v=_Eihf86CMlg
DOCUMENTÁRIO DE RENATO FALZONI http://www.youtube.com/watch?v=_Eihf86CMlg
ASILO COLONIA AYMORES |
Homenagem a Jésus Gonçalves |
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Entrevista com Jaime Prado: A hanseníase e o Asilo-colônia de Aimorés |
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Jésus Gonçalves Esteve internado na Aimorés entre 1933 e 1937
Nesta página o historiador e jornalista Jaime Prado, residente em Bauru, SP, nos conta um pouco da história do antigo Asilo-colônia de Aimorés, hoje Instituto “Lauro de Souza Lima”, local onde eram internadas as pessoas portadoras da lepra ou hanseníase. Jaime trabalha na instituição desde o ano de 1976 como Servidor Público. Ao longo dos anos Jaime tem produzido muitos materiais registrando a história daquela instituição que abrigou milhares de pessoas enfermas, dentre as quais Jésus Gonçalves, o nosso homenageado que ali viveu entre 1933 e 1937. Em artigos e registros fotográficos que pretendemos amealhar com o concurso de amigos colabo- radores, tentaremos prestar da melhor forma que conseguirmos esta justa homenagem a este homem exemplar ao qual endereçamos nossos pensa- mentos da mais profunda e sincera gratidão. (Ismael Gobbo)
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Jaime, você pode nos fazer sua auto apresentação
Ismael, sou Jaime Prado 59 anos, brasileiro, casado com Helena Maria Antônio Prado, tenho uma filha Thaynara Fernanda Antônio Prado. Nasci na cidade de Santópolis do Aguapéi, SP, aos 25 dias de Março de 1953, filho de Mariano de Almeida Prado e Mariacy da Costa Prado. Meus pais tiveram três filhos, eu e minhas duas irmãs. Sou de família simples e por este motivo tenho minhas raízes profundas na humildade e preservo os ensinamentos dos meus pais já falecidos.
Qual a sua formação acadêmica e profissional?
Sou servidos público estadual há 36 anos, no atual Instituto “Lauro de Souza Lima”, em Bauru, SP, onde realizo um modesto trabalho na preservação da história do antigo Asilo-Colônia Aimorés, expondo fotos em preto e branco com datas, dados e textos referentes à história desta instituição genuinamente bauruense. Não sou nada além de um simples apaixonado pela história que eu conheço desde 1968, que apesar de possuir um rico material de informação nada em representado para a instituição. Sou Jornalista na Função de Repórter Cinematográfico: Mtb: 038076 pela FENAJ – Federação Nacional de Jornalismo.Trabalhei como Repórter Cinematográfico e colaborei na fundação da TV Centrinho da USP em Bauru/SP em 1996. Participei na fundação da TV USC da Universidade do Sagrado Coração a USC de Bauru/SP. Militei durante 10 anos consecutivos como Repórter Cinematográfico na Televisão da Universidade do Sagrado Coração, onde tive o prazer e o privilégio de acompanhar a visita do Papa Bento XVI no Brasil, de gravar com o Juiz Italiano Baltazar Garzon, o mesmo que prendeu o Pinochet e de documentar e gravar a última matéria com o professor do Toquinho, o saudoso PAULINHO NOGUEIRA, em sua residência em São Paulo dois dias antes da sua partida terrestre. Também gravei as ultimas entrevistas com as personalidades que cito: os inesquecíveis Paulo Autran, Mauro Rasy, Dom Vicente Marcheti Zioni, primeiro Bispo da História de Bauru e o Arquiteto bauruense Jurandir Bueno Filho. Ainda, tive o prazer de documentar com exclusividade a história do primeiro astronauta brasileiro Marcos Pontes em um passeio a bordo da antiga Maria Fumaça, durante a Semana Nacional de Ciência e Tecnologia realizada no prédio da extinta estação ferroviária de Bauru.
Como se deu o seu ingresso como funcionário no Asilo-Colônia Aimorés em Bauru, destinado aos portadores da hanseniase?
Bem, minha história com o Asilo-Colônia Aimorés vem de muito tempo. No ano de 1937, uma tia querida foi internada nessa colônia de isolamento. Ela foi levada de sua casa, numa cidadezinha do interior onde a família morava, pelos guardas do Departamento de Profilaxia da Lepra. Lá ela faleceu em 1946 e a família não teve o direito de saber onde ela estava, nem mesmo após a morte para visitar o seu túmulo. Este trauma eu carrego desde quando ouvi os relatos dos meus avôs sobre o fato. Também outro acontecimento marcante foi a internação de outra tia nossa ocorrido em 1956 o que a obrigou ficar separada dos quatro filhos por muitos e muitos anos, cerca de 30 anos, até a conclusão do seu tratamento. Apesar dos meus 59 anos de vida, o passado ficou gravado na minha memória, com imagens em preto e branco, e que fazem parte do meu arquivo histórico intimo.
Sabemos que a lepra, Mal de Hansen, ou hanseníase, é uma das doenças mais antigas e cujos registros encontramos na Bíblia, dentre outras fontes. Poderia nos falar alguma coisa sobre a doença desde a antiguidade e como eram tratadas as pessoas que a possuíam?
Nos registros da antiguidade, no Velho Testamento e também no Novo, o assunto é tratado em diversos momentos, inclusive com os relatos de que Jesus Cristo curou vários leprosos.. No livro Levítico, ao que consta escrito por Moisés, em seus capítulos 13 e 14, há descrição da doença, relatando sobre as manchas que apareciam na pele do doente e a consequente proibição das vítimas de conviverem com as demais pessoas. Segundo consta em países como a França, se queimava os portadores da lepra, para que o mal não se propagasse. A doença não deixa de ser um estigma ainda. Concluindo posso dizer que se acabamos com a palavra “lepra” ainda convivemos com a hanseníase que ainda é vista com ares preconceituosos e de temor.
Os portadores da lepra eram discriminados no Brasil?
Não só eram discriminados como afastados da família e da sociedade. Prova disto é que as antigas colônias eram construídas longe das cidades, como aconteceu com o Asilo-Colônia Aimorés, a ultima a ser construída no Estado de São Paulo, cujo início da construção se deu em 1928. Esta colônia está localizada, propositalmente, a cerca de 12 quilômetros do centro de Bauru., para excluir os doentes do convívio social.
Como eles, os doentes, eram segregados nessa época?
Muitos doentes eram retirados do convívio familiar ou isolados, alguns nas próprias casas onde residiam, em quartos independentes ou as vezes trancados em algum cômodo sem manter contato com os demais familiares. A alimentação era servida através de um buraco. As famílias desconheciam a causa da moléstia e isso causava clima de terror entre as pessoas. Alguns enfermos chegavam a carregar um pequeno sino para anunciar que era doente da lepra.
Quais as leis brasileiras que determinaram a segregação dos leprosos?
No Brasil as leis são antigas e dados históricos da década de 1920 já falam do inicio das construções dos conhecidos leprosário. A Lei Federal número 610, de 13 de janeiro de 1949 foi criada para isolar os portadores da lepra, quando os guardas do Departamento Sanitário e do DPL - Departamento de Profilaxia da Lepra saiam à procura dos doentes que muitas vezes eram denunciados pela própria família ou pelos vizinhos. Na época muitos eram levados à força, sem rumo e sem destino, ou melhor era encaminhados para a cidade dos excluídos, as antigas colônias de leprosos.
No Brasil, onde foram criados os estabelecimentos para abrigar os portadores da lepra?
Em vários estados foram construídas as colônias de isolamento. No estado de São Paulo podemos registrar: Colônia do Padre Bento, em Guarulhos; Colônia de Santo Ângelo, em Mogi das Cruzes; Colônia de Cocais, em Jundiapeba, Colônia do Pirapitinguí, em Itu, e, por ultimo, a Colônia Aimorés, em Bauru que, por muito tempo, foi conhecida como “Cidade Jardim”, em referência à beleza da sua arquitetura e a bela jardinagem, bem cuidada pelos próprios internos da instituição.
Como foi concebida Colônia Aimorés?
A Colônia Aimorés surgiu como resultado de uma Campanha na Imprensa Bauruense, em março de 1926, idealizada pelo jornalista José Maria de Jorge Castro, do Diário da Noroeste. A proposta consistia na realização de um Congresso Regional, com a participação de todos os municípios da Região Noroeste para tratar da situação dos portadores de lepra. Como um dos resultados advindos do congresso, se deu a publicação de vários artigos na imprensa com a finalidade de sensibilizar a sociedade bauruense para com o drama dos doentes que viviam perambulando pelas ruas da cidade, esmolando para o sustento da sua própria família. Ressalta-se que apesar de doentes, eles, os portadores da lepra, precisavam pedir esmolas para a sua sobrevivência. Como Bauru era na época um centro dos entroncamentos ferroviários, a cidade recebia pessoas de todas as regiões do estado a procura de um lugar digno para amenizar seus sofrimento em relação a moléstia que lhes afastavam da sociedade. Em razão da discriminação, os doentes construíam seus barracos e tendas às margens das estradas de ferro Noroeste, Sorocabana e Paulista, no Horto Florestal e ao lado do Matadouro Municipal. No tocante aos modelos, as colônias eram mais ou menos iguais, e, segundo as informações e dados, elas seguiam os modelos das colônias de Carville, nos Estados Unidos.Em Bauru depois da primeira reunião com os 84 municípios da Região Noroeste, da qual foi aprovada a doação de 10% dos impostos dos municípios participantes, um projeto pioneiro no Brasil, diga-se de passagem, do qual a sua cidade, Araçatuba, fez parte, na reunião do dia 27 de Setembro de 1927, conforme consta da primeira Ata lavrada. Em 1928 iniciou-se a construção dos primeiros pavilhões que, em 13 de Abril de 1933, ou seja, há 79 anos passado, inauguraram o Asilo-colônia Aimorés, que nunca mais fechou seus portões em forma de arco para receber os doentes portadores da lepra.
Nesse estabelecimento os familiares eram admitidos junto com o doente?
Não se admitiam os contatos familiares. Exemplos claros, verídicos e comprovados foi o fato ocorrido com minhas tias, uma internada em 1937 e outra em 1956. A família não foi comunicada para onde elas foram levadas, deixando para trás os familiares, filhos e seus entes queridos. Foram levados para um verdadeiro campo de concentração nazista em terras brasileiras. .
É verdade que na época os portadores da doença que não se apresentavam espontaneamente eram caçados pelas autoridades?
Sim, a polícia e os guardas, verdadeiros jagunços do tenebroso e temível DPL - Departamento de Profilaxia da Lepra do Estado de São Paulo, e do Departamento de Vigilância Sanitária, com os homens armados e sem amor algum ao próximo, caçavam e pegavam impiedosamente aqueles que eram portadores da lepra. Muitos deles foram denunciados como no caso da minha tia em 1937, que foi colocada dentro do “camburão preto” que trazia gravado as três letras do terror DPL – Departamento de Profilaxia da Lepra, no caso do Estado de São Paulo.
Como era a vida na Colônia?
Segundo os relatos de um ex-interno do antigo Asilo-Colônia Aimorés, hoje com 93 anos de idade - eu sempre procuro conversar com ele obtendo informações sobre a história do passado objetivando repassar para as futuras gerações o significado da palavra lepra – este senhor nos diz que os campos de concentração nazistas deviam ser até melhores que as colônias de leprosos porque os guardas nazistas tinham saúde e agiam por si próprios enquanto que nos leprosários, o que se via, eram doentes espancando os próprios doentes por ordem do delegado que existia na colônia. Até cadeia ou masmorra existia na colônia. Os doentes trabalhavam para cuidar da colônia a fim de torná-la uma “gaiola de ouro”. Na verdade, por detrás das cercas que separava os dois mundos, o do sadio e o do doente, existia uma outra realidade da história, que a própria história ainda desconhece.
Pelo que se pode constatar nos registros fotográficos era uma verdadeira cidade?
Sim,
era um verdadeira cidade, construída pelo Estado,
como já disse, distando cerca de 12 km do centro
da cidade. Aqui existia o Cassino Cine-Teatro, salas de jogos,
coreto na Praça Adhemar de Barros, Cadeia, Igreja, Cemitério,
Fábrica de Guaraná, Padaria, Sorveteria, Marcenaria,
Marmoraria, Tipografia, Olaria, Alfaiataria, quadra de
basquete, campo de Malha e Bocha e lagos para natação.Tem-se
que registrar que, entre 1933 a 1937 período em que
Jésus Gonçalves esteve internado, aliás o mais ilustre deles,
este liderou uma série de iniciativas que buscava promover a
integração entre os internos, amenizando-lhes a dor e o
insulamento compulsório. Com efeito, por sua iniciativa
surgiram o Grupo de Balé, de Teatro, a Equipe de
Futebol, a Rádio Publicidade Aimorés (RPA), a Jazz Band, a
Banda Furiosa, o jornal O Momento, o Centro Espírita e
inúmeras outras conquistas que de alguma forma permitiam
alguns momentos de alegria para quem carregava no peito tantos
e tantos sofrimentos. Não foi por acaso que
cognominaram Jésus Gonçalves de Missionário dos
Leprosos no Asilo-Colônia Aimorés. Jaime, o atual Instituto Lauro de Souza Lima continua a atender os pacientes portadores de hanseníase? Sim, Ismael, o Instituto Lauro de Souza Lima em Bauru, SP, continua atendendo pacientes de todas as regiões do país. Como os pioneiros no Brasil, é um instituição de referencia da Secretaria da Saúde do Estado de São Paulo e do Ministério da Saúde e, também referência mundial no tratamento e nas pesquisas em hanseníase. A trajetória do órgão foi esta ao longo do tempo: Leprosário de Bauru, em 1925 Leprosário da Estação Aimorés em 1927. Em 1928 iniciou-se a construção do Asilo-Colônia Aimorés que foi inaugurado em 13 de Abril de 1933. Sanatório Aimorés em 1949. Hospital Aimorés de Bauru em 1969. Hospital "Lauro de Souza Lima em 1974. Instituto "Lauro de Souza Lima" em 1989. Como se vê, a caminhada foi longa e pela instituição passou grandes personalidades da área médica voltadas ao combate da lepra, mal de Hansen ou hanseníase. Dentre eles podemos destacar o Prof. Dr. Diltor Vladimir Araújo Opromolla, que foi um dos discípulos do inesquecível Dr. Lauro de Souza Lima, um verdadeiro Bandeirante da Ciência Brasileira, o Médico Missionário dos Hansenianos, um Apostolo da Caridade que aplicava a medicina com o coração. Foi o responsável pela implantação do tratamento Sulfônico no Brasil, principalmente nas cinco colônias de isolamento do Estado de São Paulo. Foi Diretor do DPL- Departamento de Profilaxia da Lepra, Consultor Científico da ONU e que foi distinguido com vários títulos pela luta no combate á lepra. São muitos os casos atendidos no Instituto Lauro de Souza Lima? Ainda é grande o índice de incidência da doença? Sim, muitos casos que chegam de várias cidades da região e de outros estados. Infelizmente somos o segundo país do mundo em casos e com o índice de 8 a 10% deles apresentando sequelas irreversíveis, segundo os dados do Morhan Nacional. A incidência da moléstia ainda é preocupante no Brasil e em outros países também, motivo pelo qual a ciência luta incansavelmente para debelá-la, porém ainda fica no ar a pergunta: até quando? E ainda não temos a resposta.
Os pacientes atendidos são de que regiões? De todas as regiões do estado e do Brasil chegam pessoas a procura de tratamento e, para isto, o Instituto Lauro de Souza Lima se destaca entre um dos mais conceituados no país. Ainda existe preconceito com relação aos portadores do mal de Hansen? Amigo, o preconceito sempre vai existir por mais informação que se tenha. O trabalho do Morhan Estadual e Nacional que caminha prestando informações mas acho que ainda deveria ser divulgado muito mais nas Escolas, Municipais, Estaduais, nas Universidade Públicas e particulares. Visite a home Page:
Ali você encontrará muitas informações
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O jornalista e historiador Jaime Prado com a esposa Helena Maria ocasião em que restaurou o relógio da torre da igreja que permaneceu parado durante 30 anos |
O relógio da torre da igreja de Nossa Senhora das Dores no Asilo-colônia de Aimorés, restaurado por Jaime Prado |
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Igreja de Nossa Senhora das Dores no Asilo-colônia de Aimorés, em Bauru, SP |
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A Jazz Aimorés Band do Asilo-colônia de Aimorés. |
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Vista aérea do Asilo-colônia de Aimorés, em Bauru, SP |
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Foto de pavilhão do Asilo-colônia de Aimorés |
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O primeiro Baile da “Kermesse” no Asilio-colônia em Aimorés no ano de 1935 |
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Homenagem a Jésus Gonçalves |
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O encontro de Divaldo Pereira Franco e Jésus Gonçalves (espírito) |
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Jésus Gonçalves Borebi, SP 12-7-1902/ (Pirapitingui) Itu, SP 16-2-1947
Querido irmão Ismael:
Jésus Gonçalves merece esse carinho nosso. O que você vem fazendo é um trabalho de resgate da memória espírita e dos vultos espíritas de ontem. Deus o inspire sempre! Eu visitei o sanatório onde ele viveu e conheci a sua então esposa, uma excelente médium clarividente, embora fosse cega, de nome NINITA, bem como o filho de ambos, que se tornou, mais tarde, radialista. Isso foi em janeiro de 1951, quando fui convidado a visitar São Paulo por primeira vez, e fui acompanhando D. Zaira Pitt, que era uma benfeitora do sanatório de Pirapitinguí onde ele viveu. Zaira foi sua amiga no corpo físico. Havia também uma jovem que trabalhava em favor dos hansenianos de nome Julinha Kohleisen, igualmente espírita. D. Zaira ajudou a construir um pavilhão para cegos, surdos e tuberculosos do Sanatório. Nessa oportunidade eu proferi uma palestra no Centro que ele ali fundara, chamado Santo Agostinho, abordando a vida de Maria de Magdala, que terminou a existência no vale dos leprosos. Na visão que dele tive, um ano antes, no quintal da casa em que então residia, apareceu-me deformado pela hanseníase e fiquei chocado. Eu era quase totalmente ignorante em relação ao conhecimento espírita. Ele disse-me ser meu irmão... Eu pensei: que tipo de irmão eu tenho no Além... Então ele se foi transfigurando e apareceu-me todo iluminado. Nos lugares do corpo em que a doença havia-lhe desfigurado, apresentava-se uma tecelagem em luz. Então, ele propôs-me visitar o Sanatório de Àguas Claras, em Salvador, para hansenianos. Apavorado com a doença eu respondi-lhe que não iria. Foi então, que ele me perguntou: - Tu não preferes ir lá, a fim de não ires para lá? Claro que aceitei o desafio e, durante 55 anos fomos visitar os irmãos internados, realizando um encontro de alegria, sempre no dia 1° de janeiro. Quando os sanatórios passaram a abrigar somente casos cirúrgicos, já não havia necessidade de ali volver, porque o tratamento passou a ser ambulatorial e o denominado perigo de contágio ficou muito reduzido... Ele informou-me haver sido em outras existências, Alarico (rei dos visigodos) que invadiu Roma em 410... Um pouco antes, ao tentá-lo, Santo Agostinho foi de barco pelo rio Tibre até fora dos muros da cidade, e com um gesto, apontando a distância, expulsou-o e as suas hordas... Mas ele retornou... Curioso é Santo Agostinho haver-se tornado, desde aquela oportunidade, o que chamaríamos o seu guia espiritual. Mais tarde ele reencarnou-se com o cardeal de Richelieu, quando eu teria sido alguém que lhe esteve ao lado (Mas esta é uma outra história, que um dia lhe narrarei). E passou a ajudar-me, a socorrer-me. Em homenagem a ele visitei quase todos os antigos Leprosários existentes no Brasil e alguns no Exterior. Chico Xavier também narrou-me que mantinha correspondência com ele, enquanto reencarnado, e que, ao desencarnar, apareceu-lhe e ditou-lhe um belíssimo poema, no qual ele diz sutilmente quem fora antes e que a hanseníase o libertou do luxo e das extravagâncias...
Perdoe-me por estender-me. Abraços, Divaldo (Texto que pedimos e Divaldo P. Franco gentilmente nos escreveu em um intervalo de suas atividades doutrinárias em São José, SC, em 27/ 03/2012) |
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Alarico e o saque de Roma em 24 de agosto de 410 Imagem: http://povosgermanicos.blogspot.com.br/2009/12/alarico-i.html |
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O rio Tibre com a ilha Tiberina e as pontes Cestius (E) e Fabricius, em Roma. Foto Ismael Gobbo |
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Alarico I, Rei dos Visigodos Ilha de Peuce, atual Romênia 375/ Cosenza, Itália 410 Imagem: http://alaricomodelismo.blogspot.com.br/p/alarico-i.html |
Cardeal de Richelieu Paris 1585/ Paris 1642 |
Homenagem a Jésus Gonçalves |
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Jésus Gonçalves, uma paixão |
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Jésus Gonçalves Borebi, SP 12-7-1902/ (Pirapitingui) Itu, SP 16-2-1947
De repente, o seu pensamento “original” já não lhe pertence, o encontro parece reencontro, a ação programada é por outro antecipada e um estranho déjà vu lhe invade o imaginário. O mundo parece igual e ao mesmo tempo novo. Telepatia? Coincidência? Inspiração? Memória coletiva? Consciência interior? Será, mesmo, que a água só passa debaixo da ponte uma única vez? Jésus Gonçalves tornou-se a primeira paixão “morta” de Eduardo Monteiro. “Vivas”, muitas outras já lhe ocupavam os dias, quando ele resolveu mergulhar no mundo daquela figura mítica e ao mesmo tempo tão pouco conhecida. Com uma papelada imensa que ele chamava de livro, veio ter comigo em São Bernardo do Campo, quase às vésperas de um carnaval. Seco e seguro da obra, ofereceu-a para publicação na editora então iniciada. Político, assegurou pretender meu prefácio. A paixão é capaz de arroubos espetaculares, mas é, também, provedora de ilusões terríveis. Jésus Gonçalves brotava intenso daquele caos, como jamais havia ocorrido, justificando a grande e imorredoura admiração do autor e de milhares e milhares de leitores num futuro próximo. Eduardo descobriu aquela existência submersa, percebeu a sua força e içou-a das águas turvas onde se encontrava, com uma convicção tal que não haveria no mundo alguém, jamais, capaz de barrar-lhe a vontade de torná-la pública. Entendeu ter em mãos mais um “apóstolo da caridade” e engoliu em seco quando viu a expressão no título do livro substituída por “vida extraordinária” e a obra passar por uma reorganização que implicava costuras e supressões. Três meses depois, porém, Eduardo exultaria: lançado, o livro “A extraordinária vida de Jésus Gonçalves” tornou-se o primeiro grande fenômeno de vendas da Editora Correio Fraterno do ABC, consumindo, em menos de um ano, duas edições de seis mil exemplares cada. E em pouco tempo, as vendas ultrapassam a marca dos vinte mil livros. Um autor estreante, uma obra sem grandes apelos literários num ambiente de terceiro setor. Qualquer entendido de mercado livreiro se surpreenderia com isso. Que fatores contribuíram para tão grande sucesso? Para compreender, necessário retornar ao final dos anos 70, início dos 80. Temos um espiritismo brasileiro marcado por lutas políticas internas e um grande apelo à assistência social, num país dominado por um governo militar ditatorial. Grande parte dos novos adeptos surgia sob o signo da caridade e Eduardo Monteiro, filho da classe alta, atende ao apelo depois de vencer uma obsessão que o levou, inclusive, jovem, a Chico Xavier. Seus caminhos se bifurcam e vão dar num sanatório hanseniano muito conhecido: Pirapitingui, localizado na região de Itu, interior de São Paulo. Desenvolve-se ali um trabalho assistencial intenso, e o principal grupo é liderado por Walter Venâncio, um pioneiro dessas atividades regulares no Sanatório de Pirapitingui. Eduardo, ativo, bem relacionado socialmente, rude e humano como poucos, toma gosto por aqueles internos procrastinados e logo, logo, forma seu próprio grupo, abrindo-se para várias frentes de atuação. O objetivo é dotar o sanatório de condições mais humanas, levando dignidade às almas ali internadas. Alimentos que suprem as necessidades do corpo, energias que atendem as necessidades do espírito, respeito pelas famílias, atividades culturais, lazer, assistência médica eficaz. Em pouco tempo, porém, a luta se amplia no sentido de uma mudança cultural profunda da sociedade em relação aos leprosos. Era preciso banir esse termo milenar carregado de preconceitos e discriminação, dominante socialmente. Em seu lugar, hanseníase, mais leve, mais humano. O projeto requer ações políticas, movimentos populares, intensificação das discussões nos veículos de comunicação de massa. Eduardo não vai medir esforços, nada vai deter sua disposição. No Sanatório de Pirapitingui, a figura de um ex-interno ilustre vai crescer na mente de Eduardo e vai levá-lo a jogar-se de corpo e alma no resgate de sua existência: Jésus Goncalves. Eduardo vai descobrir o gosto pela pesquisa e Jésus Gonçalves vai alçá-lo Brasil afora nessa marcante atividade. Eduardo descobre-o ali, mas ali está apenas uma parte de Jésus. As outras, muitas, precisa garimpar, peneirar e colocá-las à prova. Então, Jésus era Jesus na certidão de nascimento, mas, por sua solicitação via mediunidade, muda-se a grafia para Jésus. Não desejava o espírito ser tomado pela figura maior do cristianismo. Na Bahia de 1949, Jésus acabava de (re)fazer amizade com Divaldo Franco, num (re)encontro curioso e um pouco assustador para o jovem médium baiano. Jésus, “morto” pouco mais de dois anos antes, era desconhecido de Divaldo. Eduardo, no garimpo, os descobre. Mas a viagem à memória pregressa está apenas começando. Eduardo localiza Jésus não muito distante de Pirapitingui, mais precisamente em Borebi, sua cidade natal. Os pais, os irmãos, a orfandade precoce, o trabalho, o casamento, os filhos, a viuvez e a inteligência, tudo isso encontra espaço no papel do escritor, até que o escritor se depara com o seu biografado envolto no manto da moléstia mais temida: a lepra. Eduardo segue-o, passo a passo, dia a dia, até Jésus ser apartado da sociedade e lançado, sem dó nem piedade, no espaço imundo e esquecido de um sanatório. Eduardo acompanha sua revolta, sua niilização, sua desesperança completa. Mas tem tempo de continuar viajando para trás até descobrir respostas possíveis à desdita de uma alma fascinante. Encontra Jésus em Alarico, o rei dos Visigodos, não uma, mas duas vezes. Encontra Jésus, ainda, em França, na pele do temível Richelieu, onde também está Divaldo Franco com outra indumentária física. Por fim, encontra-o desorientado no espaço sideral, lamentando os malfeitos e implorando por outra vida na Terra e uma dura prova: a lepra. Jésus toma corpo cada vez mais frente ao seu escritor. E se revela extraordinário quando a “ocasionalidade” o faz mudar de pensamento frente à natureza e o mundo. A descrença é substituída pela esperança, a esperança reconstrói o caminho. Aquela vida, que parecia despencar mais uma vez, reergue-se, para marcar de vez um novo destino. É aqui que seu valor se mostra por inteiro, mesmo que o tempo, implacável, lhe seja curto demais para tantos projetos. Antes de deixar para trás o que lhe restava, ainda, de corpo físico, Jésus constrói uma obra admirável para melhorar a vida dos seus colegas igualmente segregados, lhes devolvendo um pouco da dignidade perdida. Foi a paixão de Eduardo por Jésus Gonçalves que levou o autor a revelar este mundo fascinante de uma inteligência humana em provação extrema. E foi a coragem incomum de Jésus que comoveu os leitores, aquela massa humana imensa mergulhada na obra assistencial, fazendo do livro um admirável best seller. O autor se foi; o personagem já, muito antes, havia ido. A obra, porém, continua comovendo, como um incentivo impagável, os corações ávidos de um sol cálido para os seus dias lentos e frios.
Wilson Garcia Recife, PE
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Hospital Dr. Francisco R. Arantes. Tambem conhecido como Pirapitingui ou simplesmente “Pira”. Itú, SP Foi um dos maiores leprosários do Brasil. Imagem: http://pt.wikipedia.org/wiki/Hospital_Dr._Francisco_Ribeiro_Arantes |
Entrevista com D. Jandyra Gonçalves da Silva |
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Jésus Gonçalves Exemplo de Superação |
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Publicada no jornal Folha Espírita Edição de maio/2012. página 12.
Jandyra Gonçalves da Silva, é a única dos filhos de Jésus Gonçalves ainda encarnada. Bauru, SP. Foto Ismael Gobbo Ismael Gobbo
Prestes a completar 88 anos em 22 de maio, Jandyra Gonçalves da Silva é a única filha encarnada de Jésus Gonçalves, o ex-ateu que se converteu numa das mais reverenciadas figuras do Movimento Espírita do Brasil, e que deu título ao livro do historiador Eduardo Carvalho Monteiro A Extraordinária Vida de Jésus Gonçalves. Nascida em Itapetininga e moradora de Bauru, Jandyra conta que o pai nasceu em Borebi, a 12 de julho de 1902, filho de João Gonçalves e de Josepha Mendes. Quando a mãe dele desencarnou, Jésus tinha apenas 3 anos de idade. E, como o pai era pobre e levava vida dura na roça, precisou ser tutelado pelo tio Antonio Arruda, na cidade de Agudos, com o qual viveu parte de sua infância. Aos 14 anos, já morando em Borebi, trabalhou em serviço braçal em fazenda, até que, aos 17, mudou-se para Bauru, onde chegou a ser importante figura da sociedade local, trabalhando como tesoureiro da prefeitura. Diagnosticado com hanseníase, porém, Jésus viu-se diante de um drama. Abandonado pelas pessoas que antes o assediavam, agarrou-se ao amor da família e ao Espiritismo, para superar a dor e o sofrimento, num exemplo de resignação e fé. “Foi ingressando no Espiritismo que meu pai encontrou a paz”, resume Jandyra, nesta entrevista à Folha Espírita.
Folha Espírita – Como foi a vida de Jésus em Bauru? Jandyra Gonçalves da Silva – Por ser criança e ter tido pouca convivência com ele, não me lembro de quase nada. O que sei é que, embora de origem humilde, foi bem-sucedido profissionalmente e chegou a ter um emprego importante na Prefeitura de Bauru, onde foi tesoureiro até se aposentar por causa da doença que o levaria para o Asilo-Colônia Aimorés.
FE – Deve ter sido muito sofrido para ele se ver diagnosticado com hanseníase, não? Jandyra – Meu pai sofreu demais quando a doença foi descoberta em plena juventude. Ele era muito bonito. No começo, revoltou-se, porque era pessoa muito benquista na sociedade, participava dos eventos e, de repente, a notícia desagradável mudou muito a situação. O preconceito, o medo, o desconhecimento da causa, tudo fazia com que as pessoas se afastassem de um doente naquelas condições.
FE – Ele não encontrou nenhuma solidariedade? Jandyra – Da família, sim. E também do seu compadre João Martins Coube, do qual era amigo e que lhe queria muito bem. Quando foi constatada a doença, e na iminência de meu pai ir para o isolamento, ele lhe arrumou uma pequena chácara onde pudesse viver. Mas chegou um momento que não teve mais jeito e papai foi encaminhado para o asilo-colônia. As pessoas com hanseníase eram muito discriminadas e essa rejeição deixava meu pai muito triste.
FE – A senhora fazia visitas a ele? Jandyra – Eu o visitei várias vezes. Recordo que existia um murão no local chamado de parlatório. De um lado ficavam os doentes; do outro, os visitantes. As pessoas não podiam se tocar, uma coisa muito triste. Eu cantava para papai, que ficava muito contente e chamava os amigos para me ouvir.
FE – As deformações no corpo de Jésus já apareciam quando estava no Aimorés? Jandyra – Não, ali ele não tinha nenhuma deformação. Só em Pirapitingui, para onde foi transferido, é que as sequelas começaram a aparecer. A lesão no nariz deixou meu pai muito abatido, até revoltado, porque de uma pessoa bonita ele se viu transformado.
FE – Fale-nos um pouco de dona Anita na vida de Jésus Gonçalves. Jandyra – Papai, que ficou viúvo de minha mãe, Theodomira, quando eu tinha 3 anos, conheceu e viveu com uma companheira muito especial chamada Anita Vilela. Ela não era doente de hanseníase e foi sua companheira em Aimorés. A luta foi enorme junto às autoridades para que ela conseguisse a permissão para viver com ele num leprosário sem ser leprosa. Ela mudou a vida dele, deu provas de seu amor e o levou para o Espiritismo.
FE – E o Espiritismo na vida dele? Jandyra – Foi ingressando no Espiritismo que ele encontrou a paz e foi aceitando a doença com mais resignação. Embora ele ainda permanecesse triste e desapontado, já começava a enxergar o sofrimento de outra maneira.
FE – E como foi essa conversão de Jésus, que se dizia ateu, ao Espiritismo? Jandyra – O acontecimento deu-se no dia do velório de Anita, em 1943. Uma pessoa presente transmitiu uma mensagem psicofônica dela ao meu pai, que a identificou pela forma carinhosa com que ela pedia para ele não mais duvidar da existência de Deus.
FE – E dona Ninita? Jandyra – Ninita foi sua terceira mulher e alguém que o ajudou muito. Ela era portadora de hanseníase e foi sua companheira no asilo. Ninita conhecia o Espiritismo, era médium e foi quem muito ajudou meu pai a se firmar na Doutrina. Viveu ao lado dele até quando desencarnou.
FE – A senhora foi ao enterro dele? Jandyra – Sim. Ele morava numa casinha nos fundos do centro espírita construído pelos adeptos da Doutrina, em Pirapitingui. Recebia muitas visitas, inclusive de caravanas que chegavam de todo o Brasil para visitar os doentes e para vê-lo, pois ele já se tornara um grande nome do Espiritismo.
Abaixo outras fotos não constantes da publicação.
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Jésus Gonçalves e a primeira esposa, d. Theodomira, em foto com dedicatória datada de 1926 Foto do acervo particular de Jandyra Gonçalves da Silva |
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Jandyra Gonçalves da Silva, Ismael Gobbo e José Carlos Gonçalves da Silva, filho de Jandyra e neto de Jésus Gonçalves, segurando o quadro do avô quando este tinha aproximadamente dezoito anos. Foto Arquivo Ismael Gobbo |
Asilo Colônia-Aimorés (Bauru, SP) Jésus Gonçalves ficou internado neste leprosário de 1933 à 1937 (Foto arquivo de Jaime Prado)
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João Martins Coube, compadre e mecenas de Jésus Gonçalves Imagem cedida por Jaime Prado |
Jandyra (E) com a tia e madrinha Luiza Trindade, irmã de Jésus Gonçalves, que a criou. Imagem do acervo particular de Jandyra Gonçalves da Silva, Bauru, SP. |
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Tumulo de Jésus Gonçalves em Pirapitingui (Itu, SP) Foto/autora:
Helena Bueno |
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Asilo colônia de Pirapitingui. Imagem cedida por Jaime Prado |
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Um pouco da história da RIE-Revista Internacional de Espiritismo |
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Asylo Colonia Pirapitinguy |
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Publicação da RIE Edição de agosto de 1934, pag 226
Visite o site da Casa Editora O Clarim
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Foto do Asilo-colônia de Pirapitingui fornecida pelo historiados Jaime Prado, de Bauru, SP
Jésus Gonçalves com sua última companheira Ninita, médium espírita e também portadora de Hanseníase, no Asilo-colônia de Pirapitingui (Itu, SP). Imagem: http://www.jesusgoncalves.org.br/biografia.htm
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Entrevista com Célia Xavier Camargo (Rolândia, PR) |
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Homenagem a Jésus Gonçalves |
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ENTREVISTA PARA ISMAEL GOBBO NOTICIAS DO MOVIMENTO ESPIRITA.
Célia Xavier Camargo
Célia, o que poderia nos dizer sobre a vida de Jésus Gonçalves como encarnado?
Conheço o que li em “A Extraordinária Vida de Jésus Gonçalves”, obra do saudoso Eduardo Carvalho Monteiro. Jésus Gonçalves nasceu em Borebi (SP), em 12/07/1902, em família muito pobre. Aos 14 anos já trabalhava no campo, junto com sua família. Cedo se interessou por música, aprendendo com um tio a tocar num velho “baixo de sopro”. Dinâmico, junto com alguns companheiros, algum tempo depois fundou uma bandinha, passando a animar as festas de fins de semana. Àquela época, ele já mostrava as características de liderança que marcariam sua existência. Aos 17 anos resolve mudar de vida, buscando novos rumos. Foi para Bauru (SP), onde encontrou muitas dificuldades, mas jamais desanimou. Pela primeira vez frequentou um colégio, visto que recebera algumas lições de um tio. Com 20 anos tornou-se Tesoureiro da Prefeitura de Bauru e casou-se com Dona Theodomira (que já tinha duas filhas) e com ela teve quatro filhos. A felicidade do casal durou pouco, pois sua esposa ficou doente,com tuberculose, e àquela época essa doença era fatal. Desencarnou em 1930, se não me engano, e deixou Jésus sozinho com seis crianças para cuidar, sendo que o menor tinha apenas 3 anos. Apesar das dificuldades, Jésus fazia-se conhecido na cidade pela sua simpatia, conquistando as pessoas quer no trabalho, quer na vida social, que o tratavam com respeito, amizade e consideração. Uma característica muito presente em Jésus era o desejo de levar alegria ao povo, o que fez participando da Banda de Bauru como clarinetista. Também se dedicou ao teatro, encenando peças que, geralmente, eram de sua autoria, e tornou-se articulista de dois jornais de Bauru. Desse modo, a gente percebe que a vida de Jésus Gonçalves não foi fácil, pois além de todas essas atividades, existia ainda o seu lar, onde a presença de seis crianças exigia atenção e cuidados. Uma vizinha, Anita Vilela, condoída da situação dele, desdobra-se para ajudá-lo com os deveres de casa e com as crianças, acabando por envolver-se sentimentalmente com ele, o que resultou em casamento. Todavia, os problemas de Jésus estavam apenas começando. Ele nota que em seu braço direito formam-se pequenas manchas e tubérculos nas orelhas. Um médico lhe dá o diagnóstico terrível: é portador do mal de Hansen, moléstia antigamente chamada de lepra e temida desde a Antiguidade. Então, seu futuro como um ser humano livre deixava de existir, uma vez que deveria ser separado da família e encaminhado para um leprosário pelo resto da sua vida, pois não existia cura para a hanseníase. Era a lei de ação e reação que lhe cobrava as consequências do mal que plantara como conquistador implacável e sanguinário, através dos séculos, na execução da Justiça Divina. Apesar do sofrimento, da separação dos entes queridos, Jésus Gonçalves jamais se revoltou, entregando-se à lei. Assim, a Saúde Pública o levou para o Asilo-Colônia Aymorés, recém-inaugurado e que ficava perto de Bauru, causando a separação de sua família. Ali chegando, Jésus viu que todos tinham o mesmo problema que ele. Apesar do sofrimento, da frustração de ver sua vida assim modificada, ele jamais desanimou. Logo se tornou líder dos internos: fundou um pequeno jornal, criou uma bandinha, escrevia e encenava peças de teatro e participava do time de futebol. Após algum tempo, foi transferido para o Hospital Colônia de Pirapitingui. Na verdade, Jésus tinha problemas de fígado e gostaria de ser transferido para o Hospital Padre Bento (Guarulhos), pois diziam que lá os internos tinham melhor atendimento médico. Acabou conseguindo a autorização de transferência para Padre Bento, mas na viagem teve tantos problemas com o fígado, que a ambulância foi obrigada a fazer uma parada no Hospital de Pirapitingui (Itu), para que Jésus pudesse se recuperar um pouco e receber atendimento médico. O diretor do Hospital, ao saber que era Jésus Gonçalves, que já conhecia pela fama, o convence a ficar ali em Pirapitingui, prometendo-lhe melhor atendimento médico. Jésus aceitou, e ali permaneceu até o final da sua existência. Muito dinâmico, logo pediu a criação de uma Estação de Rádio, fundou um jornal, um grupo de teatro, uma bandinha e movimentou o Hospital. Apesar de tudo isso, ele sentia um vazio imenso dentro de si, pois era ateu. Quando a esposa, Anita Vilela, desencarnou, ele ficou desesperado. A ajuda divina não se fez esperar: Uma médium presente no velório ficou mediunizada e o espírito da falecida, estando ali ainda o caixão, conversa com Jésus, falando-lhe de coisas que só eles sabiam. Em certo momento, a entidade diz a ele: “Velho, não duvides mais. Deus existe!” Após esse episódio, Jésus, bastante impressionado, começou a pesquisar nos livros espíritas a explicação para aquele fenômeno, começando pela obra “O Céu e o Inferno”, de Allan Kardec. Dessa forma, ele acaba se tornando espírita. Funda a “Sociedade Espírita Santo Agostinho”, dentro do Hospital de Pirapitingui, que continua até hoje em plena atividade. Como os doentes tivessem muitas necessidades e o poder público não correspondesse às necessidades, dando-lhes o mínimo para viver, Jésus começou a mandar cartas para os espíritas de vários estados, que faziam coletas, enchiam caminhões e iam levar a eles no hospital. Foi graças à ação desse baluarte do Espiritismo que, após uma longa luta, finalmente os Hospitais Colônias foram abertos à visitação pública, pois antes era absolutamente proibida a entrada de pessoas de fora. Muitas caravanas começaram a chegar, notadamente José Herculano Pires, de São Paulo, e seus amigos, que visitavam Jésus Gonçalves, tornando-se grandes amigos, assim como Francisco Cândido Xavier, com quem Jésus se correspondia e que foi visitar assim que deixou o corpo físico e ainda antes que o Chico soubesse da sua libertação. Nisso tudo, é de se valorizar a nobre figura de Anita Vilela, que sempre esteve junto de Jésus Gonçalves no leprosário, sem que se encontrasse a ficha dela, o que configura que ela internou-se com ele para acompanhá-lo, sem ser portadora do mal de Hansen. Para finalizar, só posso dizer que procurei fazer um resumo da vida de Jésus Gonçalves, pois não dá para contar tudo sobre a vida desse grande trabalhador da seara de Jesus. A verdade é que ele foi um marco valoroso como ser humano, dando grande contribuição com seu exemplo para o Espiritismo no Brasil.
Você manteve contatos com seus familiares?
Infelizmente não. Seu filho Jaime também era interno em Pirapitingui e, posteriormente, foi morar fora do hospital. No entanto, pelo que eu soube, os familiares preferiam não tocar no assunto. Talvez pelo sofrimento que já tinham passado, queriam esquecer os horrores daquela época e levar uma vida normal.
Como se deu o seu primeiro encontro com o espírito Jésus Gonçalves?
Não sei precisar. Jésus Gonçalves era um dos espíritos que se comunicavam através da mediunidade de meu pai, Urbano de Assis Xavier. Lembro-me que, ainda criança, enquanto brincava eu sentia a presença de um espírito observando e, não sei por qual razão, sentia que era ele. Posteriormente, já casada e com filhos, um dia, participando de uma reunião mediúnica no Centro Espírita Allan Kardec, de Cambé (PR), nosso amigo Sr. Hugo Gonçalves me disse: Célia, vejo Jésus Gonçalves ao seu lado e não é a primeira vez. Acho que ele vai querer escrever por seu intermédio. E orientou-me para que escolhesse um dia da semana e um horário para tentar psicografia. E foi o que eu fiz. No início, porém, ele tentava escrever sonetos, que é um gênero difícil de poesia. Nada consegui de bom, tendo Jésus mais facilidade para repassar-me romances.
Você viu e vê o espírito Jésus Gonçalves? De que forma ele se lhe apresentou?
Como afirmei, não tenho mais visto Jésus Gonçalves. Acredito que ele deve ter considerado encerrado seu trabalho comigo e foi dedicar-se a outras atividades, talvez esteja exercendo outras tarefas. Agora, quanto à sua aparência, eu o via mais ou menos como mostram suas fotos. Não com problemas devido à hanseníase, vejo-o normal.
Quantos livros ditados por Jésus Gonçalves você psicografou e de que eles tratam?
Foram os três primeiros que recebi: “Perdoa!”, “Aves sem ninho” e “Em busca da ilusão”. O primeiro, “Perdoa”, relata uma história que se passa no século 6, quando Jésus Gonçalves foi Ciro, um soldado do exército bisantino sob o comando do General Belisário, durante o reinado do Imperador Justiniano. No segundo livro, “Aves sem ninho”, basicamente o mesmo grupo de espíritos retorna para as lides terrenas. O drama transcorre entre o século 11 e 12, na França, durante o reinado de Felipe Augusto, enfocando inclusive a guerra entre França e a Inglaterra, de Ricardo Coração de Leão. O terceiro, “Em busca da ilusão”, a história inicia-se na França, mas posteriormente muda para a Espanha focalizando a Inquisição. Depois, não soube mais desse grande amigo.
Você tem levantamento de todas as obras escritas em vida por Jésus Gonçalves e dele na condição de desencarnado?
O que conheço da lavra de Jésus Gonçalves enquanto encarnado, é o livro de poesias, “Flores de Outono”, editada após seu retorno ao mundo espiritual. Obra muito interessante e na qual se percebe bem a diferença do autor/ ateu e do autor/ espírita, visto que a obra foi organizada em três partes: a primeira, ele ainda como ateu; a segunda, ele espírita e encarnado; e a terceira, ele espírita e desencarnado. Extraordinária a maneira como ele escreve, especialmente sonetos (que não é para qualquer um, diga-se de passagem.), com uma precisão de linguagem e um estilo inconfundível. Na primeira parte, ele escreve mostrando a alma sem esperança, machucada pelos reveses da vida, indignada, revoltada. Depois, a sua transformação pela Doutrina Espírita, em que as poesias mostram o conformismo diante daquilo que ele estava passando em vida, agora sabendo ser obra da Justiça Divina; apesar de não conhecer o motivo, sabia ser justo seu sofrimento. Excelente! Li várias vezes o livro “A Extraordinária Vida de Jésus Gonçalves” e “Jésus Gonçalves - O Poeta das Marcas Redentoras”, ambos de Eduardo Carvalho Monteiro. Se existe algum outro, ignoro.
Além dos livros que ditou o espírito Jésus Gonçalves lhe fez algum outra referencia pessoal a respeito das suas encarnações?
Não. Sei que ele foi o conquistador Alarico I, rei dos visigodos (século IV); retornou como Alarico II no século V e, posteriormente, renasce como Duque de Richilieu, na França do século XVI, cujas façanhas e maldades todos conhecem pela obra de Alexandre Dumas, “Os três Mosqueteiros”. Nas obras que ele escreveu por meu intermédio, ele foi Ciro, um soldado do Império Bizantino, sob o comando do general Belisário, enquanto imperava Justiniano, no século VI. Na obra “Aves sem ninho”, ele viveu na França do rei Filipe Augusto, no século XII, como sacerdote católico, cometendo muitos erros. Na obra “Em busca da ilusão”, ele foi um sacerdote, membro do Santo Ofício, também mergulhando no erro e na crueldade, no século XV. Depois, fiquei sabendo que suas últimas cinco encarnações foram como leproso, o que ouvi numa palestra de Divaldo Franco há muitos anos, salvo engano da minha parte. Depois de tantas existências frustradas, teve essa última no século XX, quando muito sofreu e procurou elevar-se através do Evangelho de Jesus e da Doutrina Espírita. À Jésus Gonçalves, pois, o nosso carinho e a nossa gratidão, rogando ao Mestre o ampare e ilumine cada vez mais, onde quer que se encontre.
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Enteados e filhos de Jésus Gonçalves Neréia e Ligia, filhas do primeiro casamento de Theodomira. Jaime, Jandyra, Helena e Carlos, filhos de Jésus e Theodomira |
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Nas extremas: José Carlos Gonçalves da Silva (Zelão), neto de Jésus Gonçalves e a esposa Helena Gonçalves. Heron filho de Zelão e Helena, Jandyra (única dos filhos de Jésus Gonçalves encarnada) e Ismael Gobbo. Bauru, SP, 04/2012 |
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Cartas perdidas no tempo, dos leprosos e seus familiares do Asilo-colônia Aymorés, Bauru, SP. Arquivo Jaime Prado |
Parlatório que existiu no Asilo Aymorés. Doentes à esquerda e visitantes à direita, sem nenhum contato físico. Acervo de Jaime Prado |
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Festa de Natal no Asilo-colônia Aymorés no ano de 1935. Jésus Gonçalves esteve internado no estabelecimento de 1933 à 1937. Foto do acervo de Jaime Prado |
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Discurso proferido na Bauru Rádio Clube por Jésus Gonçalves no dia 16-8-1935 |
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Homenagem: |
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Jésus Gonçalves: “O poeta das Chagas Redentoras” |
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Abaixo colocamos poesias da lavra de Jésus Gonçalves em momentos diferentes de sua vida. Antes de ser espírita e acometido de hanseníase; leproso e já espírita e depois de desencarnado através da psicografia de Francisco Cândido Xavier. .
Jésus Gonçalves
JÉSUS GONÇALVES ANTES DE SER ESPÍRITA
Chorando
A minha “esperança” perdeu-se e foi dar na casa onde vive a senhora saudade; pois, mãos invisíveis, fecharam meu lar e deram meus filhos à dona orfandade!
Havia um começo de felicidade, nas asas do sonho que voava a cantar... Mas, veio um bacilo, – que infelicidade! – e toda a familia se pôs a chorar!...
Depois, esta ausência, cruciante, infinita, por causa da praga, chagosa e maldita, que, como um sarcasmo, se prega marcando...
Por essa saudade, que não tem mais um fim, lá longe eles vivem chorando por mim, enquanto eu por eles também vou chorando...
(Livro “Flores de Outono” Jésus Gonçalves/ Francisco Cândido Xavier)
Jésus Gonçalves, primeiro à direita, na equipe de futebol do Asilo-colônia Aymorés, em Bauru, SP. Foto do acervo de Jaime Prado
JÉSUS GONÇALVES ESPÍRITA
Afinal
Em luta tenebrosa eu me batia, julgado, por mim mesmo, um pária errante. Uma nefasta, atroz melancolia, tomava as rédeas do meu ser pensante.
A vida era uma carga torturante. Lutava, sem saber porque o fazia. A par miséria e dor, sempre constante plantava no meu ser a rebeldia.
Quando a dor foi mais forte, mais pungente veio, afinal! A luz do Espiritismo, esclarecendo a treva de repente...
Por isso, felizmente, é que compreendo, na esplendorosa luz do cristianismo, minha ventura de viver sofrendo!
(Livro “Flores de Outono” Jésus Gonçalves/ Francisco Cândido Xavier)
Jésus Gonçalves no Asilo-colonia de Pirapitingui já com as seqüelas da lepra Imagem cedida por Jaime Prado
Jésus visitado em Pirapitingui por Julinha Kobleisen (de lenço) e Zaíra Pitt. Do Livro: A Extraordinária vida de Jésus Gonçalves
JÉSUS GONÇALVES DESENCARNADO
Ante Jesus (*)
I
Inda vejo, Senhor, de alma oprimida, a Trácia devastada, a ânsia de Atenas, Constantinopla em lágrimas e penas e Roma flagelada e envilecida...
Vejo a conquistadora e horrenda lida, o gozo, o saque e a morte, em velhas cenas, e o fausto senhoril que trouxe apenas desilusão e horror à nossa vida.
E ouço-Te a voz, Jesus, dizendo – Basta! De um rei fizeste um verme que se arrasta e abriste-me o caminho da aflição!...
Anos correram como sombras vagas. Mas depois de vestir-me em lepra e chagas, achei-Te, excelso, no meu coração!
II
Hoje, Senhor, não peço o vão tributo das multidões famélicas, vencidas, que humilhei, no transcurso de outras vidas, semeando miséria, pranto e luto...
Das rosas que me deste por feridas recolhi muita graça e muito fruto. Passageiras vitórias não disputo, nem procuro vanglórias esquecidas.
Perdoa-me, Senhor, se agora venho, recordando-te as úlceras no lenho, rogar-Te algo das bênçãos que entesouras!
E que eu possa, feliz com o dom divino, socorrer os irmãos do meu destino no turbilhão das chagas redentoras!
Poesia de Jésus Gonçalves, psicografia de Chico Xavier, livro Trinta Anos com Chico Xavier, Clóvis Tavares, IDE Pags. 188 a 190, 6ª. edição, 2001 Após declarar ter sido Alarico, célebre rei dos Visigodos e antigo aliado militar do Imperador Teodósio o espírito assina
Alarico, o leproso, Jésus – o rei...
Chico Xavier psicografando em Pedro Leopoldo, MG Acervo de Jhon Harley M. Marques. Pedro Leopoldo, MG |
Pirapitingui |
-- Jésus você, quando encarnado foi para a família espírita desta Pirapitinguí, um verdadeiro Pai, um verdadeiro Mestre, sempre pronto a dar sábios conselhos a todos àqueles que se achavam sob o cutelo da dor, tanto com a palavra como com o exemplo dignificante. A sua acolhida simpática e generosa dava-nos coragem de externar com serenidade as nossas mágoas mais pungentes e, também, as nossas mais ridentes alegrias, quando esses sentimentos apoderavam-se dos nossos corações. Encarnado, não mais teremos o ensejo de ouvir seus sábios conselhos e ensinamentos; entretanto, a nossa certeza é inabalável que você continuará, do espaço infinito, a nos guiar, porque você nos ama e quer que levemos o barco poderoso da espiritualidade, construído neste recanto com o seu mais ardente carinho, para a felicidade dos que comungam os seus ideais, a um porto seguro e cheio de bonança. Falar das suas virtudes seria querer transportar as águas de um rio caudaloso para um copo comum, pois elas são inumeráveis, tão vastas e incontáveis como as gotas de um oceano, no seu espírito puro e radiante; a principal delas, entretanto, é a caridade que você tanto cultivou e que se reflete, como num grande espelho, nas lágrimas alheias que você enxugou com sua bondade, testemunho vivo da sua nobreza de coração, que dispensava os seus interesses pessoais para, cumprindo ao mandado de Cristo, amar ao seu próximo como a si mesmo. O seu espírito forte e decidido enfrentou, sereno, todas as batalhas para a implantação do puro cristianismo nesta cidade e, hoje encampados, vemos crescer, com viço exuberante, essa árvore já frondosa -- o espiritualismo -- abrigando, sob sua copa acolhedora e amiga, algumas centenas de almas que colhem os frutos produzidos por essa ciência incomparável que nos apresenta um Deus soberanamente justo e infinitamente bom. Por que não deixamos de dar cumprimento à sua justiça, oferece sempre um meio de seus filhos saldarem as suas dívidas, a causa pela qual você Jésus Gonçalves, lutou vencendo valorosamente, para esclarecimento daqueles que punham e põem em jogo a perfeição divina. Continue amigo e irmão, nessa cruzada que, num futuro muito próximo, será a redenção do gênero humano, livrando-o das peias da dívida sobre o além-túmulo. Ampare-nos sempre, a nós que somos os seus discípulos mais chegados, para elevarmos aos píncaros da glória esse ideal gigantesco de fazer dos que aqui carpem as suas dores, um só rebanho, para termos um só pastor: -- nosso muito Amado Mestre Jesus Cristo. -- Peça, Jésus, ao meigo Rabi da Galiléia, que nos proteja e abençoe sempre para recebermos a sua preciosa inspiração e a dos Espíritos Luminares das Falanges Celestes, assim como nós pedimos a Ele que lhe dê, continuada e progressivamente maiores esclarecimentos da Escalada Infinita... Às 11 horas do dia 16 de fevereiro de 1947 desencarnou neste asilo o senhor: Jésus Gonçalves; transcrição da oração que um membro da "Sociedade Espírita Santo Agostinho" proferiu antes da saída de seu féretro...
Livro: (Jésus Gonçalves O Poeta das Chagas Redentoras) "Eduardo Carvalho Monteiro"
(Texto recebido de José Carlos Gonçalves da Siva, Zelão, neto de Jésus Gonçalves, Bauru, SP) |
Homenageando Jésus Gonçalves |
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Versos aos Enfermos |
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Jésus Gonçalves 1902-1947
Escuta
a provação que te visita,
(Livro “Flores de Outono”, Lake, 4ª. Edição, pagina 123. |
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Jésus Gonçalves esteve internado para tratamento de hanseníase (lepra) em dois Asilos-colônia: Aymorés (Bauru, SP) de 1933 à 1937 Pirapitingui (Itú, SP) de 1937 à 1947 Despertou de forma decisiva para o Espiritismo no ano de 1943. Revoltado até então, a partir daí se tornaria um dos seus grandes vultos. Leia a biografia aqui: http://www.noticiasespiritas.com.br/2012/MARCO/12-03-2012.htm
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Festa para os internos do Asilo-colônia de Aymorés, no final do ano de 1935. Jésus Gonçalves estava ali. Foto do acervo do historiador Jaime Prado, Bauru, SP . |
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Reprodução do editorial do Jornal “O Momento” fundado por Jésus Gonçalves no Asilo-colônia Aimorés Imagem do acervo de Jaime Prado |
Homenagem a Jésus Gonçalves 1902- 1947 |
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Divaldo Pereira Franco e a linda vidência de Jésus Gonçalves (espírito) |
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Jésus Gonçalves 1902- 1947
Do Livro: O Peregrino do Senhor Altiva Glória F. Noronha Capitulo 15
Narraremos, neste capitulo, algumas experiências mediúnicas de Divaldo Pereira Franco. Todas são autênticas; aconteceram de fato e de verdade. “Os desígnios de Deus são impenetráveis. As suas soberanas leis estabelecem as diretrizes da vida, objetivando o progresso e o aperfeiçoamento do ser, nas várias etapas do seu processo reencarnacionista. O homem em particular é o resultado das suas experiências anteriores, programando, por conseqüência, a sua aprendizagem futura. Em cada etapa, quando bem intencionado e adestrado para os valores positivos, libera-se dos problemas negativos, afirmando as tendências superiores, com objetivos de elevação. Por isso, em momento algum, cabe ao homem o desânimo, a descrença, a negação da vida. De instante a instante, mudam-se as paisagens nas quais ele se encontra colocado. Modificam-se os valores e abrem-se oportunidades, onde antes estavam problemas e impedimentos. É Divaldo quem assim nos fala, nesta beleza de raciocínio, prosseguindo em seguida a complementar a idéia: “Fazendo um retrospecto da minha vida, em cada passo encontro a mão de Deus conduzindo-me com segurança, embora a minha rebeldia inconsciente para os objetivos relevantes da existência planetária. A cada momento, uma interferência judiciosa, um apontamento oportuno, uma mão amiga, constituíram-me e constituem-me o apoio para a tarefa que reconheço pequena, mas, para mim, muito valiosa, objetivando o meu próprio bem. No ano de 1949, quando os tormentos obsessivos me avassalavam, porque ainda não me adestrara no conhecimento espírita, e também pela juventude do corpo, todas as tardes eu tinha por hábito ir sentar-me no quintal da casa onde morava, no Bairro do Machado. O quintal dava o fundo para as Invasões, onde centenas de casebres sobre o lamaçal apresentavam grave problema sócio-econômico dos que residem em tal região, em Salvador. A minha vida íntima, sacudida por inquietações e tormentos, por ansiedades e incertezas, era uma constante busca da paz, uma contínua procura de Deus. Numa tarde muito especial para mim, buscando a calma interior, eu me pus a orar. O quadro que se me erguia à frente era de muita beleza. O Sol declinava por sobre o pantanal e havia um silêncio exterior muito grande. Procurei, então, mergulhar nas blandícias da prece, pedindo a Deus a mão socorrista, assim como aos Bons Espíritos o seu apoio e assistência, para que não viesse a resvalar pelas rampas do desequilíbrio. Foi nesse momento que, de súbito, eu vi chegar um ser espiritual com características para mim até então jamais vistas: apresentava profundas marcas na aparência física. Um dos pés, que parecia ter os dedos amputados, estava envolto em gaze, com uma deformidade visível. O corpo alquebrado, a cabeça marcada por cicatrizes, o nariz deformado, sem o septo nasal, e uma expressão de profunda melancolia, olhando-me com enternecimento e carinho comovedores. Na minha ignorância, na minha falta de discernimento doutrinário, pensei de imediato: apesar da prece, eis aí a presença de um Espírito obsessor. Bem se vê que eu confundia, então, a aparência com o conteúdo, a realidade íntima. Foi quando o ouvir dizer nitidamente: Não sou um bem-aventurado, mas tampouco eu sou um obsessor. Sou teu irmão. Chamo-me Jésus Gonçalves, e desencarnei, não há muito, num sanatório de leprosos, em Pirapitingui, Estado de São Paulo. Naquela época ainda não se usava o verbete hanseniano. Era a palavra marcadora, quase cruel, da tradição bíblica. E ele prosseguiu: Fomos amigos. Venho, de etapa em etapa, ressarcindo a duras penas o que contraí desde os dias em que, na condição de conquistador, disseminei a morte pela guerra, destruindo lares, roubando vidas, deixando órfãos e viúvas a prantearem os seus mortos. Indiferente, à alheia dor, era devorado pela volúpia da insanidade destruidora. Mais tarde, muito mais tarde, já conhecendo Jesus, não me foi possível fugir daquela compulsão guerreira e, em posição relevante na política francesa do século XVII, novamente me engalfinhei em lutas tenebrosas, sendo um dos responsáveis pelo prosseguimento da guerra franco-austríaca, especialmente na sua terceira fase. Em chegando do lado de cá, dei-me conta da alucinação que me devorava e roguei ao Senhor, por misericórdia, me concedesse a lepra purificadora, para o despertar dos deveres de profundidade, aqueles que me poderiam conscientizar das finalidades superiores da vida. Eis por que, desde então, venho no processo purificador, havendo concluído uma etapa muito consciente, em Pirapitingui, no Estado de São Paulo, poucos anos atrás, onde pude integrar-me no serviço da Revelação Espírita, entregando-me a Jesus”. Enquanto falava, Jésus Gonçalves se metamorfoseava. Aquela aparência lôbrega e triste se transfigurou diante dos olhos deslumbrados de Divaldo, que pôde ver-lhe a luminosidade interior. Esta lhe chegava como sendo pequeno sol, clareando o crepúsculo do entardecer. E onde antes havia deformações em seu corpo, agora estava a presença das luzes, a forme bem feita, como se tecida de substância luminescente. Jésus Gonçalves então disse, como a querer dar uma explicação à surpresa de Divaldo: O que a lepra carcomeu ficou sublimado nas regiões perispirituais. Mas, venho aqui, por dois motivos, falar contigo. Na reunião doutrinaria de hoje, estará presente uma amiga muito querida. Desejo que a informes do nosso encontro. O segundo motivo é que eu te queria pedir visitares a colônia de leprosos desta cidade, no subúrbio de Águas Claras. Ante a surpresa da proposição, ainda marcado pelo tabu e pela ignorância em torno do mal de Hansen, Divaldo respondeu, comovido: Por favor, não me faça um pedido de tal natureza. Esta doença, cujo nome nem sequer eu pronuncio, tal o pavor que me causa, assusta-me demasiadamente e eu nunca teria coragem de visitar o lugar onde estivessem pessoas com ela ... Jésus Gonçalves sorriu da ingenuidade de Divaldo e redargüiu: Divaldo, eu te estou pedindo que vás lá, a fim de que não vás para lá! Preferes ir lá ou para lá? Divaldo, naturalmente, disse apressadamente que era claro, ele preferia ir lá! Jésus Gonçalves então falou que ele iria tomar as providencias compatíveis, para irem os dois juntos, falar um pouco aos irmãos hansenianos. E diluiu-se diante dos olhos assombrados de Divaldo, deixando-lhe, porém, uma indefinível sensação de paz e bem-estar... À noite, em seu grupo de trabalhos, no Centro Espírita “Caminho da Redenção”, fundado havia já dois anos e funcionando ainda em sala ampla, numa casa na mesma rua onde tem hoje a sua sede definitiva, Divaldo contou esta experiência aos irmãos e perguntou se, por acaso, alguém ali já ouvira falar ou conhecera Jésus Gonçalves. Levantou-se então, uma senhora portadora de grande beleza do corpo e da alma e declarou: Jésus Gonçalves foi meu amigo. Quase desencarnou em meus braços. Convivi com ele, quanto me permitiram as possibilidades. Sou mineira do interior, e resido na capital de São Paulo, há muitos anos, onde mantenho um serviço de visita a várias casas de leprosos. Meu nome é Zaira Pitt. Em companhia de Julinha Koffmann e de outros, procuramos dar assistência aos nossos irmãos leprosos. Neste momento, com um grande número de amigos, estamos ajudando a construção do pavilhão para tuberculosos hansenianos, lá mesmo no hospital de Pirapitingui. A senhora confirmou, disse Divaldo, para a surpresa de todos nós, a existência desse Espírito, dizendo a ele estar vinculada, fazia muito tempo. Quando o jovem baiano disse que Jésus Gonçalves pedira que ele visitasse a colônia de leprosos de Águas Claras, D. Zaíra Pitti estimulou-o muito para essa tarefa, dizendo que não havia o menor perigo de contágio, como comumente se pensava e propalava por aí... Jésus Gonçalves, antes de retirar-se, naquela tarde em que se manifestara a Divaldo, aconselhara-o a ler um livro que o ajudaria a perder o medo da lepra, intitulado “Eles Caminham Sós”, dizendo, mais, que ele o faria chegar às suas mãos, através de alguém. Com o pedido do Espírito comunicante e o encorajamento dado por Zaíra Pitti, Divaldo, então, propôs aos freqüentadores do Centro Espírita, a visita àquele lar expurgador. Amigos mais bem relacionados na sociedade entraram em contato com o diretor do hospital, o qual, de inicio vetou aprioristicamente o plano da visita. Mas, a insistência de Divaldo, ante a afirmativa de que o objetivo era apenas fazer uma visita fraterna, levando alguns brindes e um pouco de alegria, respeitando todas as instruções da casa, ele aquiesceu, impondo uma série de restrições. Até aquela época, 1949, o mal de Hansen ainda gozava de muitos tabus e preconceitos que impediam as visitas. Mas Divaldo logrou a liberação da ordem de impedimento e o grupo fez a primeira visita. Foi com ela que iniciou a série de excursões que até hoje faz à colônia de hansenianos, em Águas Claras. Isto, há 36 anos consecutivos! D. Zaíra Pitti havia viajado a Salvador com o objetivo de conhecer a família do Dr. Ernesto Carneiro Ribeiro, o insigne filólogo, o qual então se comunicava em São Paulo, através de um jovem médium por nome Moacyr, que realizava cirurgias mediúnicas, especialmente de câncer, de que ela, Zaíra Pitti, era portadora, com resultados excelentes. Tinha vindo para agradecer à familia e trazer uma mensagem do Dr. Carneiro Ribeiro aos que haviam ficado na carne. Visitando uma Instituição Espírita de Salvador, alguém havia indicado o nome de Divaldo; por isso ela havia ido ao Centro Espírita “Caminho da Redenção”, naquela noite, naturalmente inspirada por Jésus Gonçalves. Ela retornou a São Paulo, mas tornou-se grande amiga e benfeitora de Divaldo. Em 1950, o Sr. José Gonçalves Pereira, hoje Diretor da Casa Transitória de São Paulo, departamento social da Federação Espírita daquele Estado, foi fazer uma visita a Divaldo, incumbido de um convite de Zaíra Pitti, para que, na primeira oportunidade, ele fosse levar a Grande Mensagem à Capital Paulista: pessoas interessadas na divulgação da Doutrina Espírita financiaram a passagem e ele ficaria hospedado em casa daquela mesma benfeitora dos hansenianos e dos sofredores. A viagem aconteceu em dezembro do mesmo ano de 1950. No dia 30, o jovem baiano ali chegou, sendo recebido por alguns corações amigos, dentre os quais, D. Zaíra Pitti. No dia 1º. de janeiro de 1951, o grupo foi visitar o leprosário de Pirapitingui. No grupo estavam aquela senhora, Divaldo e o Sr. Joaquim Alves, o famoso Jô, admirável trabalhador da Seara Espírita, desenhista ímpar e pintor exímio, o Dr. Lauro Michielin, um dos criadores e fundadores do Sanatório Espírita “Antonio Luiz Sayão” (Araras, SP) e que, sob o pseudônimo de Jacques Garnier, escreveu várias obras, relatando experiências mediúnicas, trazendo conceitos e reflexões muito valiosos, e que eram vendidas a beneficio do referido Sanatório (naquela época, como vemos, já existia o sistema abençoado da divulgação doutrinária, beneficiando uma obra assistencial). Chegando a Pirapitingui, o grupo teve a oportunidade de conhecer a viúva de Jésus Gonçalves. D. Ninita, cega, mas excelente médium vidente. Ela descreveu Divaldo tal como se o estivesse vendo! Falou da presença espiritual do marido ali também. Mas, uma senhora muito rica, que Zaíra Pitt levara, viúva recente, trajando mesmo luto fechado, foi quem mais chamou a atenção de Ninita, que lhes descreveu o esposo desencarnado e pediu-lhe para tirar o luto, dando-lhe uma lição de imortalidade das mais comovedoras. O grupo foi depois ao Centro Espírita “Santo Agostinho” e, ali, Divaldo proferiu uma palestra para os internados e visitantes. Após a alocução, todos voltaram à Capital. No domingo seguinte, por solicitação de D. Zaíra Pitti, Divaldo fez uma palestra na reunião das 10 horas da manhã, na Casa-Máter do Espiritismo em São Paulo. Naquela época, Pedro de Camargo, o inesquecível escritor e orador Vinicius, que mantinha uma grande assistência, havia vários anos, ali acorrendo para ouvir-lhe a palavra fluente e evangelizadora, foi quem apresentou o jovem baiano, assim falando: Muitos aí estão a perguntar quem é esse jovenzinho e o que faz ele aqui, ao meu lado. Tenho, assim, a imensa satisfação de apresentar Divaldo Pereira Franco aos nossos irmãos paulistas. Este nosso amigo vindo da Bahia traz uma mensagem de vida, com a sua mediunidade voltada para o Bem e guiada pela Doutrina Espírita, a fim de nos estimular a marcha e nos encorajar para a luta. Foi dessa forma que Divaldo proferiu a suas primeira palestra na Federação Espírita do Estado de São Paulo, vinculando-se também àquele missionário do bem e da luz, que era Vinicius, o emérito educador e o sacerdote, no sentido profundo da palavra, da mensagem evangélica e espírita. Assim, Divaldo Pereira Franco iniciou as suas pregações na capital bandeirante. Era janeiro de 1951, o que vale dizer: há quase 36 anos!
Livro O Peregrino do Senhor – 1ª. edição – LEAL- 1987
Capa do livro de d. Altiva Noronha onde está narrado o episódio acima |
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Dois livros imprescindíveis para quem queira conhecer a vida e a obra de Jésus Gonçalves. |
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Jésus Gonçalves, sentado, já com as seqüelas da lepra em Pirapitingui. Dona Ninita é a primeira de óculos escuro a partir da esquerda Julinha * é a última da direita. Foto nos livros: Flores de Outono e A Extraordinária Vida de Jésus Gonçalves
Jésus Gonçalves sentado dona Ninita, companheira de Jésus Gonçalves, um visitante, Zaíra Junqueira Pitt e Julinha Thekla Kobleisen Foto do Livro: A Extraordinária Vida de Jésus Gonçalves USE/Madras- Eduardo Carvalho Monteiro |
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Flagrante da inauguração do C.E. Santo Agostinho. Jésus Gonçalves é o quarto da direita para a esquerda. Seu filho Jaime está logo à sua direita (16/12/1945) Do livro: A Extraordinária Vida de Jésus Gonçalves. Eduardo Carvalho Monteiro. USE/Madras |
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Abaixo outras imagens de personalidades citadas nesta homenagem a Jésus Gonçalves
Divaldo Pereira Franco por ocasião da inauguração da Mansão do Caminho, em Salvador, Bahia, aos 15 de agosto de 1952. Imagem obtida em trabalho de Simoni Privato Goidanich, Quito, Equador.
* Em nossas pesquisas encontramos o nome de Julinha citada neste trabalho grafado de duas formas: Julia Thekla Kohleisen e Julinha Koffmann.
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Homenagem a Jésus Gonçalves |
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Júlia Thekla Kohleisen (Stig Roland Ibsen) |
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Jésus Gonçalves com aproximadamente 18 anos 1902- 1947 (Foto do acervo da familia, Bauru, SP)
DO LIVRO “FLORES DE OUTONO”
Neste “Flores de Outono”, o leitor atento encontrará algumas poesias dedicadas à Julinha, tais como: “Versos para Julinha” e “Um Anjo”; e indagará, Quem será esta Julinha? Ela ainda, hoje, vive e chama-se Júlia Thekla Kohleisen, declamadora, concertista (piano e sanfona), nascida em Piracicaba e, ainda muito jovem, em 1945, visitava os leprosários, tendo contribuído com a sua arte para a construção de Centros Espíritas nos locais de Pirapitingui, Cocais, Casa Branca, Gopouva e Santo Ângelo; ou incentivado as caravanas e o meio espírita para esse fim, isto com a espontaneidade que caracteriza as almas autênticas. No entanto, à falta de espaço, nesta 3ª. edição, nos obriga a limitar suas informações, fixando-nos nas mensagens por ela recebidas, relativas às tarefas que ainda aguardam mais colaboradores. Em 15 de Fevereiro de 1949, em Pedro Leopoldo, surgiu uma mensagem para Julinha, através do médium Chico Xavier, onde Jésus Gonçalves esclarece: “... eles (os hansenianos) merecem, realmente, o apoio de todos os corações dedicados ao bem. Para os doentes, todos devem olhar com respeito e ternura, com fraternidade e humildade, partilhando com tais sofredores o percurso de suas jornadas, na romagem dolorosa em que se encontram. São os grandes orgulhosos do passado em resgates nobilitadores. Trabalhar, pois, para tais instituições é dever das almas alcandoradas como a tua, Julinha!” Há outra mensagem, também recebida pelo Chico Xavier, em 03 de Dezembro de 1958, assinada por Ivan Albuquerque, já desencarnado, um jovem dedicado tanto quanto ela ao serviço assistencial aos hansenianos, assim redigida:
OUTRA MENSAGEM
Julinha, minha querida irmã. A morte do corpo, quando procuramos a luz, é libertação e, quando buscamos essa mesma luz, a vida na carne é serviço para libertar. Por isso mesmo, continuamos juntos. Concluem-se as provas no educandário, mas o trabalho continua. Não desfaleça na sementeira em que nos empenhamos. Sabemos que todos os obstáculos na Terra conspiram contra o esforço do semeador que vive acordado para os objetivos mais altos da Vida, entretanto, minha irmã, é preciso marchar assim mesmo, devotados à meta que nos propomos atingir. Prossigamos sem desânimo, sem cansaço, sem negação. A humanidade é a nossa grande família e, dentro de nosso lar que é o mundo inteiro, os sofredores e os necessitados são nossos irmãos mais próximos, a quem devemos a maior quota de nosso amor. Estamos em sua companhia no serviço da fraternidade de que não podemos descurar. Pirapitingui, Cocais, Casa Branca, Gopouva, Santo Angelo e outros setores de nossa tarefa constituem abençoados refúgios da nossa sede de Vida Superior. Aí, minha querida irmã, o nosso cântico de esperança se expande cada vez mais vivo, nossa luta se dilata na direção dos cimos da vida e podemos ensaiar a solidariedade legítima e a sublime compreensão. Quando você experimentar a travessia dos túneis de sombra que, muitas vezes, nos surpreendem na jornada terrestre, recorde a nossa presença ao seu lado... Desculpemos as pedras e os espinhos da senda, esqueçamos ofensas e discórdias para fixar a mente e o coração na luz, que a noite da ignorância espera de nossas mãos. Em verdade, o Mestre poderá cercar-nos de dons e talentos, auxiliando-nos a penetrar o castelo de nossa felicidade, mas não podemos olvidar que o Mestre forma discípulos, para o trabalho divino de perfeição a que se consagra, contando com os aprendizes para a obra do aprimoramento geral. Onde se instale o ódio, elevemos o nosso cântico de amor e onde a tristeza se concentre, espalhemos a claridade da alegria santificante que a Boa Nova nos deu a plantar no chão ainda escuro da Terra. Julinha, todas as nuvens se desfazem, todas as dores desaparecem. A vida é uma herança gloriosa de luz e felicidade. Em nossas lições de agora: sacrifício é progresso, renunciação é subida, luta é melhora, sofrimento é benção, dificuldade é ascensão e serviço incessante ao próximo é a nossa própria elevação para Deus. Amontoe os tesouros que a traça não roe e continue acendendo a lâmpada do entendimento fraterno e da bondade constante, para o grande roteiro que o Senhor nos oferece, atualmente, ao Espírito. E, felizes por merecer a graça da provação purificadora e a oportunidade de ajudar aos nossos semelhantes, rendamos louvor a Jesus pelos favores que nos concede, pedindo ao seu coração amigo e afetuoso receber todo o carinho e todo o reconhecimento do irmão saudoso e agradecido. IVAN
(Psicografada em 3 de dezembro de 1951, às 23,30 horas, em Pedro Leopoldo, MG)
Jésus Gonçalves sentado e a jovem Julinha na extrema direita. Asilo-colônia de Pirapitingui (Itu, SP)
Ainda temos este soneto, de Jésus Gonçalves, “Recordação Paternal”, dedicado como homenagem à radiosa espiritualidade de Júlia Thekla Kohleisen:
Minha filha querida, continua Lavrando o chão de nossas velhas dores, Suportando os espinhos redentores Entre o pranto e o cansaço da charrua...
Guarda contigo a fé que não recua E esquecendo tormentos e amargores, Inflama o teu caminho em esplendores Na pobreza da Terra ingrata e nua.
Planta lírios e rosas sobre a lama, Do carvão triste e seco nasce a chama Que alenta e aquece a vida transitória.
Louva, com Cristo, a luta em que te esmagas, Nossas cruzes de angústia, sombras e chagas São roteiros de luz da eterna glória.
(Psicografia de Chico Xavier)
Extraído do livro “Flores de Outono”. Jésus Gonçalves/Francisco Cândido Xavier LAKE, 4ª. edição, pags. 31 a 34
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Leia a biografia de Ivan Santos de Albuquerque por César Perri acessando:
Ivan Albuquerque 1918- 1946 |
Um pouco da história da RIE |
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Homenagem a Jésus Gonçalves |
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Jésus Gonçalves Borebi, SP 12-7-1902/ (Pirapitingui) Itu, SP 16-2-1947
Página 177 da Revista Internacional de Espiritismo publicada em agosto de 1947. Casa Editora O Clarim, Matão, SP.
Mais uma vez externamos os nossos agradecimentos à direção da Casa Editora O Clarim pelo apoio que nos oferece para este trabalho. Ismael Gobbo
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Jésus Gonçalves sentado dona Ninita, companheira de Jésus Gonçalves, um visitante, Zaíra Junqueira Pitt e Julinha Thekla Kohleisen Foto do Livro: A Extraordinária Vida de Jésus Gonçalves USE/Madras- Eduardo Carvalho Monteiro |
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Sugerimos a leitura do nosso email de ontem 15/6/2012 para melhor entender esta página. |
Um pouco da história da RIE- Revista Internacional de Espiritismo |
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Artigo: Samaritanos Modernos (Max Kohleisen) |
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Publicado na RIE- em fevereiro de 1949 páginas 6 e 7 Gentileza da Casa Editora O Clarim Matão, SP
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O autor do artigo acima, Sr. Max Kohleisen (foto abaixo), era articulista da Revista Internacional de Espiritismo e de O Clarim. Max foi genitor de Julia Thekla Kohleisen (1920- 2001), provavelmente a maior mecenas de Jésus Gonçalves (1902- 1947) quando este se encontrava internado no Asilo-colônia de Pirapitingui, SP, para tratamento de hanseníase. Estamos com estas reproduções buscando homenagear esses valorosos vultos do movimento espírita brasileiro.
Max Kohleisen (desencarnado em 1956 aos 72 anos) Imagem do livro “História do Espiritismo em Piracicaba e Região” de Eduardo Carvalho Monteiro
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Um pouco da história da RIE- Revista Internacional de Espiritismo |
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Artigo: O Mundo da Era Atômica (Max Kohleisen) |
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Publicado na RIE- em outubro de 1947 páginas 219 e 220 Gentileza da Casa Editora O Clarim Matão, SP
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O autor do artigo acima, Sr. Max Kohleisen (foto abaixo), era articulista da Revista Internacional de Espiritismo e de O Clarim. Max foi genitor de Julia Thekla Kohleisen (1920- 2001), provavelmente a maior mecenas de Jésus Gonçalves (1902- 1947) quando este se encontrava internado no Asilo-colônia de Pirapitingui, SP, para tratamento de hanseníase. Estamos com estas reproduções buscando homenagear esses valorosos vultos do movimento espírita brasileiro.
Max Kohleisen (desencarnado em 1956 aos 72 anos) Imagem do livro “História do Espiritismo em Piracicaba e Região” de Eduardo Carvalho Monteiro
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Homenagem a Jésus Gonçalves (1902- 1947) |
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Jésus Gonçalves – O triunfo do espírito na falência da matéria |
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Jésus Gonçalves Do livro Flores de Outono Da 4ª. Edição, agosto 2009. Lake- Livraria Allan Kardec Editora
Apreciação de J. Herculano Pires
Estas “Flores de Outono”, de Jésus Gonçalves, representam uma contribuição valiosa para a nossa literatura, sob vários aspectos. É indiscutível que elas possuem qualidade literária, apesar das pequenas deficiências de algumas composições. Do ponto de vista puramente artístico, excluído o material psicológico que fartamente nos proporciona, é uma coletânea interessante, revelando várias fases e aspectos de uma inteligência lúcida, dotada de grande sensibilidade poética, e prejudicada pela tremenda catástrofe da miséria e da doença, que conjugaram contra ela os seus malefícios. Basta para se ter uma pálida idéia do que foi a vida de Jésus Gonçalves, numa luta permanente e desesperada com a adversidade, a leitura deste último terceto do seu impressionante soneto “Uma Vida”:
onde nasceram novas ilusões que vieram sucumbir num leprosário...
Em três versos apenas, temos a síntese dolorosa de toda a sua existência. E por ela podemos compreender a extensão em que devemos perdoar as vacilações do poeta. Porque há, na verdade, metros falhos e momentos em que ele parece abandonado pelas divinas musas. Quem poderá saber, porém, o que se estava gestando na profundidade da sua alma e do seu corpo, por trás dessa aparente debilidade, nos instantes de eclipse do seu estro? Ou quem poderá medir o calor dos entrechoques íntimos, dos indizíveis abalos morais, criadores de momentâneas e dolorosas inibições, que lhe turbilhonavam no Espírito? Jésus Gonçalves, como todos os brasileiros pobres que se arriscaram a nascer dotados de inteligência e sensibilidade, teve de enfrentar, desde cedo, o problema do seu natural desajustamento, num ambiente contrário às manifestações da inteligência e do espírito. A vida de uma criatura refinada como ele nos meios humildes da nossa terra, é sempre uma caminhada de sacrifícios. O atrito permanente dos anseios de cultura e elevação espiritual, com o chamado “espírito-prático” da nossa gente, agravado este, nos ambientes humildes, pelo aguilhão cruciante da necessidade, é alguma coisa de dantesco. A incompreensão, a falta de recursos em todos os sentidos, o tempo malbaratado em atividades grosseiras, a carência de meios de instrução, a posição subalterna dos valores do Espírito e a predominância absoluta dos interesses materiais, são os terríveis torniquetes em que se encontra o desventurado portador de inteligência e sensibilidade, em meio da pobreza e incultura do nosso povo. Rodrigues de Abreu que, por uma coincidência curiosa, viveu também na cidade de Bauru, chegou mais cedo no sacrifício da tuberculose, mas nasceu e cresceu em condições muito favoráveis. Jésus Gonçalves passou a infância e a adolescência arcado ao peso de serviços rudes, como os de ajudante de pedreiro e trabalhador da roça. Aos vinte anos, quando contraiu as primeiros núpcias, havia conseguido uma posição melhor, ocupando, como por verdadeiro milagre, o cargo de tesoureiro da Prefeitura Municipal de Bauru. Mas, trazia as mãos calejadas e o espírito precocemente cansado. Seu primeiro casamento foi com uma viúva, que possuía duas filhas. Com vinte anos apenas, mal vencida a batalha áspera dos períodos de avassalantes pobreza, o poeta já se transformava em chefe de família! Do matrimônio, vieram-lhe quatro filhos. Ei-lo, pois, com a responsabilidade de sustento da mulher e seis crianças! Avaliemos mentalmente o que isso significa e compreenderemos de leve a vitória que representa, na vida sacrificada de Jésus Gonçalves, estas “Flores de Outono”. Mas, não é só. A mulher é atacada pela tuberculose, três anos após o nascimento do último filho. O poeta não conta nessa ocasião, mais de 36 ou 37 anos. É um homem que não pôde estudar, na infância, na adolescência e na mocidade, premido pelas tremendas necessidades de uma vida pobre, e que se vê a braços, na idade madura, com um lar desmantelado pela terrível moléstia. Em 1930, tomado pela lepra, abandona o cargo de tesoureiro da Prefeitura de Bauru e o de redator do “Correio da Noroeste”, dificilmente conquistados pela força exclusiva da sua inteligência, sem sequer o auxílio da cultura, que não pudera adquirir. Trinta e dois anos de idade, a via-crucis de uma vida de trabalho, miséria, sacrifícios, e o término da jornada mundana com a crucificação no calvário implacável da lepra! No entanto, nada conseguiu vencê-lo. Eu o conheci, no Asilo-Colônia Pirapitingui, nos seus últimos tempos. Era um pequeno farrapo humano, completamente deformado, de nariz e dedos comidos pela lepra. Nos olhos, um cansaço e uma desilusão indescritíveis. Não obstante, era o presidente-fundador do Centro Espírita “Santo Agostinho”, o organizador e dirigente da cozinha para os doentes sem recursos, colaborador assíduo de publicações espíritas de S. Paulo; dirigiu-nos, no Centro, uma saudação eloqüente, cheia de entusiasmo e de fé; e guardava consigo os originais destas “Flores de Outono”... Admirável triunfo do espírito sobre a falência da matéria! Sublime vitória da inteligência sobre a precariedade do corpo, sobre as deficiências culturais, a miséria e a desgraça de uma vida humilhada! Precisamos pensar em todas essas coisas, para podermos compreender o lugar que compete a Jésus Gonçalves na Poesia Brasileira. Trabalhos como “Tédio”, “João Ninguém”, “Teus quinze anos”, “Adão e Eva”, “A Grande Fábrica” e a “Grande Enferma” asseguram-lhe um lugar definitivo entre os nossos poetas. E além destas produções, em que a sua arte e o seu estro fulguram de maneira marcante, há o conjunto profundamente humano do livro, onde os defeitos de forma e de linguagem desaparecem, deixando-nos apenas a confissão de uma vida frustrada em todas as suas aspirações, e não obstante vitoriosa, cantando aos céus sobre as próprias ruínas, numa repetição moderna, sem a recompensa terrena, da tragédia bíblica de Jó. “Flores de Outono” não deve e não pode ficar circunscrito ao terreno da nossa literatura espírita. É um livro que tem o seu lugar no quadro geral da literatura brasileira e merece mais do que a atenção da crítica literária somente. Do ponto de vista psicológico e religioso, este livro de Jésus Gonçalves oferece farto material para estudo e vale por um lúcido testemunho. Vemos, por exemplo, na primeira parte, a fase mundana do poeta, que não chamarei propriamente de cética, em virtude das tendências místicas que já deixa entrever, e da atitude de resignação que a reveste. Há, nos versos desse período, momentos de profunda amargura. Nunca, porém, nos defrontamos com a revolta. A menos que Jésus Gonçalves tenha suprimido alguns poemas de indignação, o que não parece provável, em face do conjunto da obra, que nos dá uma visão geral do seu temperamento, vê-se que ele não foi jamais um rebelado, mesmo quando ferido nos seus mais profundos anseios. Sua amargura, embora de uma densidade por vezes wagneriana, é sempre submissa, um cantochão arrastado nas solidões do martírio, clamando entre as pedras em que se rasga, como um rio nas planícies áridas, sem espumar contra os céus. Ele sofre, geme, chora, desespera-se às vezes, mas ainda percebe a beleza da noite, dos pássaros, das flores. Não se chega a compreender como pôde ele enfrentar, dessa maneira, toda a desgraça que o esmaga. Falta-lhe uma base. Ei-lo, no entanto, sem cair, equilibrando-se na boca do abismo! Lembra a frágil e meiga velhinha de Guerra Junqueiro, n’”Os Simples”, atravessando serena o infinito dos espaços siderais, por cima do abismo da noite, por entra as constelações. Alguma coisa, porém, deve sustê-lo. Se em nada ele crê, se nada mais espera, - por que vive e por que sofre ? Em 1940, aos 42 anos de idade, escreve o soneto “Falta”, e clama:
“Mas se esta vida é um sonho, a morte o nada, o amor um pesadelo, a fé receio, por que manter-se em luta desvairada?
No entanto, eu sigo... acovardado, triste... a procurar, em tudo o que não creio, a coisa que me falta, e não existe!”
Esse fato, entretanto, existia. Essa coisa o mantinha e impulsionava, através de toda as adversidades. E essa coisa ele, finalmente, encontrou nas revelações do Espiritismo, doutrina que, pondo em bases racionas o problema doloroso da vida, era a única que podia falar ao seu coração desamparado e descrente, à sua inteligência perquiridora e lúcida. “Novos Rumos” surgem na sua vida. Ele é, desde então, “o homem que acordou do torpor da morte”. Corre o ano de 1943, e àquele soneto, “Falta”, de 1940, ele responde com outro, cujos tercetos exprimem a sua convicção final:
“Pois nem a vida é sonho e a morte o nada. O amor é luz; a fé, o santo meio de tornar esta luta compensada! Por isso eu sigo, nos caminhos meus, a procurar em tudo quanto creio, a coisa que faltava e... que era Deus!”
Deus, não o que castiga, mas o que se alegra com a conversão do pecador e procura favorecê-la através das oportunidades da reencarnação; esse Deus espírita que é um verdadeiro pai de todas as criaturas, e Jesus Cristo, o revelador da vida imortal, são os dois polos entre os quais se centraliza, dali por diante a vida, a obra e a arte de Jésus Gonçalves. Ele se transforma no Santo do Pirapitingui. Funda um Centro e cozinha dos enfermos pobres; canta em versos sonoros a grandeza da imortalidade e os princípios da Doutrina; entrega-se de corpo e alma às pregações evangélicas; distribui consolações às almas avassaladas daquela colônia de dores. É um dispensador de conforto, procurando por todos os que se desesperaram. E nos dá, como em “A Grande Enferma”, poesias das mais expressivas de toda a literatura espírita. Não analisarei aqui o mérito e a beleza das mensagens mediúnicas de Jésus Gonçalves, recebidas pelo grande médium Francisco Cândido Xavier. Elas falam por si mesmas, a crentes e descrentes. Mas, direi apenas que o Espiritismo, se nenhuma conversão real até hoje produzido, nenhum benefício tivesse ainda prestado à humanidade, só com esta maravilhosa transformação de um poeta leproso, far-se-ia digno da admiração e respeito de todas as consciências capazes de compreender as angústias humanas.
“Flores de Outono” Livro importante que traz poesias de Jésus Gonçalves antes de ser espírita, depois que conheceu o Espiritismo e após desencarnado pela psicografia de Chico Xavier. |
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Casa onde nasceu e viveu Jésus Gonçalves em Borebi, SP. Foto de Fevereiro de 1978 Imagem do livro: A Extraordinária Vida de Jésus Gonçalves USE/Madras- Eduardo Carvalho Monteiro |
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Representação teatral em Pirapitingui. Da direita para a esquerda: Jésus Gonçalves, Lidia Tarsi, Zinda Anizini, Silvio Neto e Rita Romero. Foto do livro A Extraordinária Vida de Jésus Gonçalves. USE/Madras- Eduardo Carvalho Monteiro |
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Jésus Gonçalves e o seu verdadeiro “anjo da guarda” Julinha Thekla Kobleisen A jovem de Piracicaba que fez da vida um sacerdócio em beneficio dos leprosos. Imagem do livro: A Extraordinária Vida de Jésus Gonçalves USE/Madras- Eduardo Carvalho Monteiro |
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Texto original do soneto “Recordação Paternal” de Jésus Gonçalves, psicografado por Francisco Cândido Xavier, endereçado para Julinha. Imagem do livro: A Extraordinária Vida de Jésus Gonçalves USE/Madras- Eduardo Carvalho Monteiro |
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Flagrante em Pirapitingui Julinha Kobleisen abraçada a um menino hanseniano. Ninita (de óculos escuro); Salviano Siqueira Martins (de terno branco) e o casal Tardelli (em primeiro plano) Imagem do livro: A Extraordinária Vida de Jésus Gonçalves USE/Madras- Eduardo Carvalho Monteiro |
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Grupo de hansenianos em frente à Sociedade Espírita “Santo Agostino”, em Pirapitingui. Jésus Gonçalves está sentado, tendo ao seu lado Ninita (1946) Imagem do livro: A Extraordinária Vida de Jésus Gonçalves USE/Madras- Eduardo Carvalho Monteiro |
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Visita de caravaneiros espíritas ao Sanatório de Pirapitingui na década de 1940 sob a liderança de João Lopes. Do livro: A Extraordinária Vida de Jésus Gonçalves. Eduardo Carvalho Monteiro. USE/Madras |
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“A Extraordinária Vida de Jésus Gonçalves” Livro precioso de autoria do consagrado historiador Eduardo Carvalho Monteiro |
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PIRAPITINGUI PARTE 1 http://www.youtube.com/watch?v=y3LB0M4mHmg
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