A felicidade terrestre é relativa à posição de cada um. O que basta para a felicidade de um, constitui a desgraça de outro. Haverá, contudo, alguma soma de felicidade comum a todos os homens?

Com relação à vida material, é a posse do necessário. Com relação à vida moral, a consciência tranquila e a fé no futuro.

Questão 922 de O Livro dos Espíritos

Vivemos num mundo de relatividade, condiciona­dos pelo ambiente em que nos situamos, o que determi­na que cada indivíduo tenha suas próprias ideias quanto ao mínimo necessário à felicidade.

Um executivo com rendimento mensal de duzen­tos salários mínimos, aplicados inteiramente em favor de seus caprichos e diversões, conforto e bem-estar, sentir-se-á o mais infeliz dos mortais se reduzido à décima parte desse valor. Já o operário de salário-mínimo sentir-se-á no paraíso se receber dez vezes mais ─ uma fortuna para ele.

Portanto, sem recorrer a cifras, podemos considerar que o mínimo necessário à felicidade, sob o ponto de vista material, é desfrutar do essencial à existência, relaciona­do com alimentação, habitação, educação e saúde.

Aqui deparamos com o primeiro entrave à felicida­de na Terra, porquanto populações imensas sofrem per­turbadora carência desses recursos.

Se não nos enquadramos nessa população sofredo­ra não há porque nos sentirmos infelizes, a não ser que cultivemos vaidades e ambições. Há muita gente angus­tiada e até desajustada porque não pode ter o palacete de seus sonhos, “aquele” automóvel, o incrementado apa­relho de som, o sofisticado guarda-roupa ou porque não pode realizar a desejada viagem. Muita gente que viveria bem melhor se cuidasse de assuntos mais importantes.

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Seremos felizes, materialmente, se nos contentar­mos com o necessário para viver, superando as pressões da sociedade de consumo que, com seu incrível agente ─ a propaganda ─ induz-nos a desejar o supérfluo e a consu­mir até mesmo o que é nocivo, como o fumo e as bebidas alcoólicas.

A esse propósito vale lembrar Diógenes, famoso filósofo grego, que demonstrava um absoluto desprezo pelas convenções sociais e pelos bens materiais, em obe­diência plena às leis da Natureza.

Proclamava que para ser feliz o homem deve liber­tar-se do supérfluo, limitando-se ao essencial: andava descalço, vestia uma única túnica que possuía e dormia num tonel, que se tornou famoso em toda a Grécia.

Certa feita viu um garoto tomando água num ria­cho, a usar o côncavo das mãos.

─ Aí está ─ exultou o filósofo ─, esse menino acaba de ensinar-me que ainda tenho objetos desnecessários.

Ato contínuo, dispensou a caneca que usava, pas­sando a utilizar-se das mãos.

Alexandre, o grande, senhor todo poderoso de seu tempo, curioso por conhecer aquele homem singular e desejando testar seu famoso desprendimento, aproxi­mou-se dele em fria manhã de inverno, quando Dióge­nes se aquecia ao sol.

Conversaram durante algum tempo. Então, Ale­xandre se propôs a atender a qualquer pedido seu. Que escolhesse o bem mais precioso, que enunciasse o capri­cho mais sofisticado e seria prontamente atendido.

Diógenes contemplou por alguns momentos o ho­mem mais poderoso da Terra, senhor de vasto império. Depois, esboçando um sorriso, disse-lhe:

─ Quero apenas que não me tires o que não me po­des dar. Estás diante do sol que me aquece. Afasta-te, pois...

Evidentemente não podemos levar Diógenes ao pé da letra, mesmo porque estamos longe do desprendi­mento total. Ele representa um exemplo de como pode­mos simplificar a existência, despindo-nos de condicio­namentos e modismos, superando o artificial e o supér­fluo, para que, efetivamente, sob o ponto de vista mate­rial, não haja impedimentos à nossa felicidade.

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Se nos contentarmos com o necessário teremos condições para tratar de assuntos mais importantes, co­mo a felicidade em plenitude, que é uma edificação inte­rior, uma espécie de conquista moral.

Seremos felizes em nosso universo interior se tiver­mos “a consciência tranquila e a fé no futuro”.

Aqui o assunto começa a ficar complicado...

Será que temos feito o que é absolutamente certo, justo, verdadeiro? Temos respeitado integralmente o se­melhante? Temos contido nossos impulsos inferiores? Temos trabalhado pela paz, onde estamos? Temos con­tribuído para a harmonia no lar?

Tudo isso e muito mais é necessário para que tenha­mos tranquilidade de consciência.

Raros se furtam a dias aflitivos de angústia, em que sentem um imenso vazio em suas almas, mente tortura­da por ideias infelizes.

Uma análise retrospectiva dirá que esse estado de­pressivo se originou de uma má palavra, de um compor­tamento vicioso e irresponsável, de uma atitude agressi­va, de um gesto impensado ─ tudo isso passível de ferir nossa consciência, precipitando-nos no desajuste.

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Consideremos o mais importante:

Se há milhões de pessoas que não dispõem do míni­mo necessário à existência, muitas delas residentes em nos­sa cidade, podemos proclamar que temos a consciência em paz sem estar tentando algo em seu benefício?

Afinal, admitindo que Deus é nosso pai, somos todos irmãos! E o mais elementar dever de fraternidade impõe que o irmão melhor situado ampare o irmão em penúria.

Que diríamos de alguém que edificasse confortável residência num oásis, em pleno deserto, cercando-a de altos muros e se negando sistematicamente a socorrer os viajores cansados e sedentos que passam lá fora?

É exatamente isso que fazem os homens em sua maioria: preocupam-se com o oásis. Esquecem-se de seus irmãos...

Não nos iludamos. O Espiritismo é suficientemen­te claro ao demonstrar que a angústia existencial que afli­ge muita gente, que tem tudo para ser feliz, sustenta-se na criminosa indiferença, na deliberada surdez aos ape­los da própria consciência, que pergunta, insistente: O que está você fazendo em beneficio de seus irmãos?

Almir Del Prette (São Carlos/SEOB)

            Guerra e Paz é o título de um magnífico romance da literatura russa de Leon Tostói. Liev, como era conhecido, foi um pensador notável, sendo considerado um renovador da vida cristã na Rússia, dedicando-se, nessa obra, a esmiuçar a questão do livre arbítrio, quando a situação e a história adquirem poder de imposição. A guerra adquire tal predicado quando os homens falam no diálogo e no cultivo da paz.  Desde as épocas mais remotas da humanidade, a guerra, mais do que a paz, joga com uma força poderosa, arrastando pessoas, comunidades e nações ao comportamento coletivo beligerante. Em 1917, conflitos isolados, se estenderam envolvendo nações aparentemente pacíficas. Estava em curso o que foi denominado de primeira guerra mundial. Menos de quarenta anos depois, países que estiveram no epicentro daquele grande conflito iniciam a segunda guerra mundial. A destruição em tão grande proporção, o horror, a morte de milhões de crianças e jovens deixou um rastro de vergonha e dor presentes em nossa história coletiva.

            Todas as conseqüências derivadas daquele período assustador deveriam nos impelir à paz tão almejada. Contudo, embora se reconheça alguns progressos nos dias atuais, nossa paz ainda é frágil e necessita de muita atenção. Agora mesmo, quando tudo parecia caminhar bem autoridades de Israel e Palestina se acusam de negligência nos cumprimento dos acordos. Do outro lado, os Estados Unidos parecem se esquecer de erros históricos e se arvoram em arbítro do planeta. Por sua vez, a maioria dos países europeus faz vista grossa aos incessantes gastos militares, não obstante as enormes dificuldades econômicas vividas pelo povo. Fazemos ouvidos moucos ao que Jesus, há cerca de dois mil anos sabiamente esclareceu: “Deixo-vos a paz, a minha paz vos dou, não vo-la dou como o mundo a dá” (Jo, 14-27). Essa paz de Jesus não é a mesma dos tratados entre os países e não temos, ainda, salvo experiências isoladas, clareza sobre sua vivência. Ela, certamente, vai além dos acordos de não agressão, de convênios de cooperação firmados entre governos e perdão de dívidas.

            A paz romana era a paz do vencedor da guerra, ou seja, conveniente à expansão de Roma. Essa é a paz ainda predominante no círculo das nações. A paz de Jesus exige uma aprendizagem, uma nova maneira de ver o mundo e uma glorificação contínua da vida. Essa paz começa no âmbito da família, se desdobra para a vizinhança e alcança a comunidade. Essa paz não compactua com lutas de qualquer natureza, denominadas eufemisticamente de esporte. Também não aceita que torcedores de times adversários sejam tratados como inimigos. Precisamos lembrar que Jesus ensinou os seus discípulos a dizerem: A paz esteja contigo. E, em outra ocasião completou: “Vim para que tenham vida e que a tenham em abundância” (Jo:10, 1-10). Paz é a força protetora da vida!