A
entrevistada Dra Marlene Rossi Severino Nobre é médica, presidente da AME-
Associação Médico Espírita do Brasil e também da AME Internacional. É a
diretora do jornal Folha Espírita, de São Paulo, capital. Dra. Marlene é
viúva do grande jornalista Dr. José Freitas Nobre que como Deputado Federal foi um dos mais respeitados parlamentares do país.
Com larga folha de trabalho Dra Marlene continua firme e forte na sua faina
de divulgar a Doutrina Espírita pelo Brasil e pelo mundo. É atualmente um
dos mais destacados nomes do movimento espírita internacional.
ISMAEL
GOBBO. Caríssima doutora Marlene,
poderia nos fazer sua auto apresentação?
MARLENE NOBRE Sou Marlene Rossi Severino Nobre. Nasci em Severínia, interior do Estado
de S. Paulo, em 1937, filha de pais espíritas - Pedro Severino Júnior e Ida
Rossi Severino - desde solteiros, já comprometidos com a Causa Espírita.
Eles não se casaram na Igreja Católica; reuniram os amigos no Centro
Espírita, no dia da bodas, para os abraços de confraternização. Meu pai era
de Monte Azul Paulista e minha mãe de Monte Verde Paulista, ambos muito
ligados a Cairbar Schutel – o baluarte do Espiritismo da cidade de Matão,
que tanta contribuição deu e continua dando à divulgação, ao estudo e à
vivência da Doutrina em nosso país e no mundo. E, hoje, segundo Chico
Xavier, no outro plano da vida, é o responsável pelo livro espírita no
Brasil.
Minha mãe foi, aos 19 anos,
ainda solteira, a mais jovem presidente de Centro Espírita do Brasil em uma
Casa construída em Monte Verde pelo meu avô – Aristodemo Rossi. Meu tio
Leonardo Severino, irmão de meu pai, trabalhou a vida toda em favor das
obras de Matão, viajando para conseguir assinaturas do jornal O Clarim e
da Revista Internacional do Espiritismo, ao lado de Giacomo Di
Bernardo e de outros pioneiros do interior paulista.
Ainda segundo nosso amado
Chico, eu me comunicava com o sr Schutel em Matão, antes da minha
reencarnação, o que se concretizou seis meses antes da desencarnação do
nosso amado Bandeirante do Espiritismo.
Casei-me com Freitas Nobre, em maio de 1964; tivemos dois filhos: Marcos e Marcelo. Marcos é professor de
Filosofia e Ciência Política na Unicamp e Marcelo é advogado, fazendo
parte, no momento, do CNJ- Conselho Nacional de Justiça. Tenho uma filha
pelo coração, Marilia Oliveira Chaves, que está com 21 anos e cursa
Direito. Marcelo é casado com Monica Autran Campos Machado, minha norinha,
que é juíza federal. Tenho dois netinhos – Ana Luísa e João Pedro – duas
estrelas a iluminar e aquecer nossas vidas.
Qual
a sua trajetória acadêmica e profissional?
Sou de uma época em que o
vestibular de Medicina ainda não era unificado, por isso, tendo ficado
entre os dez excedentes do Vestibular de Medicina da Faculdade de
Pinheiros (USP), fui para Ribeirão Preto, na esperança de tentar segunda
chamada por lá, mas, em 1957, não houve, porque as vagas tinham sido todas
preenchidas na mesma época em que prestei vestibular em São Paulo. Eu já me preparava para voltar para minha casa e fazer Biologia na USP, Curso para
o qual eu também havia feito vestibular e passado, quando minha amiga,
Maria Emilia Barboni, de Ribeirão, me deu uma sugestão, que mudaria minha
vida. Com bastante ênfase, ela disse que eu deveria prestar vestibular de
Medicina em Uberaba, porque o curso médico era o meu ideal e não o de
biologia. Para isso, eu não deveria perder tempo, porque os exames estavam
para ocorrer por aqueles dias. Se Medicina era o meu ideal – disse ela – eu
deveria tentar. E foi de uma bondade inesquecível, facilitando-me em tudo,
passagem de ônibus, auxílio financeiro para a pensão onde eu deveria ficar
em Uberaba, além do suporte espiritual, que só as grandes almas oferecem
aos amigos.
Foi assim que iniciei o meu
curso em Uberaba no final de fevereiro de 1957.
Terminei -o em dezembro de
1962, e depois fixei residência junto aos meus pais, na Capital paulista.
Fiquei de 1963 a 1967, como estagiária do Prof. Dr. José Medina, no
Departamento de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital das Clínicas de São
Paulo, depois, em 1967, estagiei nos Hospitais Broca e Boucicault, ambos em
Paris, por indicação do nosso chefe e instrutor do HC.
Depois, a partir de 1968, fui
para o Instituto de Previdência (Inamps) onde trabalhei cerca de 30 anos
na especialidade para a qual fui mais preparada, o serviço de prevenção do
câncer em senhoras.
Estou aposentada desde 1994,
porque antes da tarefa médica eu trabalhei seis anos como funcionária do
Colégio Paes Leme, em S. Paulo, de 1950 a 1956.
Assumi em 1995 a presidência da Associação Médico-Espírita do Brasil, acompanhando-a desde a sua fundação até
os dias de hoje. Também tomei parte na primeira Diretoria da Associação
Médico-Espírita de São Paulo, fundada em 30 de março de 1968, da qual
originaram-se as outras AMEs, inclusive a Brasileira.
Pelo
que depreendemos de resposta anterior a senhora é uma espírita de berço...
Sim sou espírita desde o
berço. Meus pais tiveram um lar muito harmonioso. Sobretudo eles nos
ensinaram o amor ao Mestre Jesus e a Kardec. Não tinham ambição material.
Eles nos criaram dentro dos padrões da simplicidade e sempre diziam que o
único tesouro que deixariam para os oito filhos era O Evangelho de Nosso
Senhor Jesus Cristo, interpretado por Allan Kardec. Uma grande herança
também que recebemos foi a de valorizar as amizades. Por décadas a fio,
meus pais foram fiéis aos amigos, ensinando-nos que os sentimentos de amor
devem sobrepujar quaisquer outros interesses.
Certa vez, Chico me disse
que, se eu fracassasse, eu não teria perdão, porque tive pais espíritas
maravilhosos. Cada vez mais, dou razão ao Chico.
Como
foi o encontro com Freitas Nobre?
Encontrei Freitas Nobre em
1962, em Uberaba, nos trabalhos da Comunhão Espírita Cristã, quando ele
realizou um grande sonho: conhecer Chico Xavier. Isto foi possível graças
ao incentivo de nosso grande amigo, Spartaco Ghilardi, do Grupo Espírita
Batuira de São Paulo, que organizava caravanas periódicas para visitar
Chico em Uberaba. Nesta mesma caravana de maio de 1962 estavam, entre
outros, o dr Luiz Monteiro de Barros e Apolo Oliva Filho, amigos de longa
data.
Na sessão pública da qual
tomaram parte, Emmanuel deu uma mensagem especial chamada Os
Pacificadores que faria parte do livro de comemoração dos 100 anos de O
Evangelho Segundo o Espiritismo. Ao final dos trabalhos, Chico nos
disse que a mensagem era dirigida ao Freitas, e complementou dizendo que o
Brasil penderia fortemente para a Esquerda, depois para a Direita, e que,
finalmente, iria para o Centro, afirmando também que o Dr. Nobre – era
assim que Chico chamava o Freitas – desempenharia um papel muito importante
na pacificação do nosso país.
Acredito, sinceramente, que
ele tenha contribuído para isso.
Em 1962, Freitas era
vice-prefeito de São Paulo, governando a cidade ao lado de Prestes Maia.
Antes ele havia sido vereador da Capital por várias legislaturas.
Casamo-nos em maio de 1964,
logo após Freitas ter deixado o cargo, já sob o jugo militar. A partir de
então foram muitos os sobressaltos sempre na expectativa da cassação dos
seus direitos políticos, o que nunca se concretizou, acreditamos, por
interferência do plano espiritual.
Desde que conheceu Chico,
toda a vida política do Freitas foi direcionada pelas cartas do Dr.
Bezerra de Menezes, através do médium. Por orientação dele, exilou-se voluntariamente
em Paris de novembro 1966 a novembro de 1967 para fazer curso de
pós-graduação em Comunicação na Sorbonne.
Em 1968, em campanha de
somente 40 dias, Freitas foi eleito, com enorme votação, deputado federal,
tendo desenvolvido um trabalho exemplar ao longo de 4 legislaturas
seguidas. Foi muito importante a sua contribuição para o MDB dos Autênticos
e para a redemocratização do país.
Como
foi sua experiência como esposa do político Freitas Nobre, de trajetória
brilhante em São Paulo e Brasília?
Felizmente, sempre me mantive
na retaguarda. Nunca participei da vida social e política de Brasília. Em
16 anos de vida parlamentar, devo ter ido à Capital do país por duas vezes
somente. Poucos da esfera política me conheceram ou me conhecem. Freitas nunca
desejou que nos mudássemos de São Paulo e isto veio de encontro ao meu
ideal de servir à causa espírita, dentro do pouco que tenho para oferecer.
Ele passava os fins de semana conosco, permanecendo mais tempo por aqui nas
férias do Parlamento.
Em 1963, iniciamos as tarefas
de assistência aos mais carentes em Santo André e São Caetano do Sul, e, em
1966, em Diadema. Conforme instrução do Chico, fundamos o Grupo Espírita
Cairbar Schutel. Freitas participou conosco dos primeiros tempos, logo
depois, a partir de 1968, ele tinha que estar em Brasília.
Embora
saibamos ser muito extensa poderia sintetizar sua participação no Movimento
Espírita?
O Culto do Evangelho em nossa
casa, feito com tanta unção por meus pais, é uma referência inesquecível na
minha vida, uma vigorosa viga de sustentação de minha alma carente de
Espiritualidade.
Também foi um marco
fundamental em minha trajetória de vida o Grupo Espírita
Conceição-Carolina, do qual participei na minha adolescência na casa de meu
avô Aristodemo Rossi, à rua Bela Cintra, em São Paulo, dirigido por meu
pai, Pedro Severino Jr., com a participação assídua do meu irmão Paulo
Rossi Severino e de alguns conhecidos e parentes, e que depois se
transformaria no Grupo Espírita Cairbar Schutel.
De 1957 a 1962, enquanto fiz Medicina na Faculdade Federal do Triângulo Mineiro, estive diretamente
ligada ao movimento espírita em Uberaba, particularmente aos trabalhos da
Comunhão Espírita Cristã (CEC), junto ao nosso Chico. Além das tarefas nas
sessões públicas da CEC, dei aulas de moral cristã na Evangelização
infantil do Centro Espírita Uberabense e fiz dois programas de rádio.
De 1963 a 1991 estive mais ligada às tarefas do Grupo Espírita Cairbar Schutel, tanto às doutrinárias
quanto às assistenciais, participando principalmente a partir de 1977 da
Creche Lar do Alvorecer. Começamos com 30 crianças e hoje temos 230. Quase
não fiz palestras nesse período, a não ser em nosso próprio Grupo, em
algumas Casas Espíritas dirigidas por amigos e conhecidos, e em Simpósios
da AME-SPaulo.
Em abril de 1974, por
incentivo do nosso Chico, meu marido fundou o jornal Folha Espírita,
com o qual colaborei desde as primeiras horas.
Em 1968, 30 de março, tivemos
um marco importante com a fundação da Associação Médico-Espírita de São
Paulo, da qual fui a primeira secretária. Muitos colegas, dentre os quais,
Luiz Monteiro de Barros, Adroaldo Modesto Gil, Antonio Ferreira Filho,
Eurico Branco Ribeiro , Maria Julia Prieto Peres, Alberto Lyra, Miguel e
Luiz Dorgan, uniram-se sob a inspiração de Batuira e Bezerra de Menezes,
através do médium Spartaco Ghilardi, para lançar as bases do movimento
médico-espírita no Brasil.
Com a desencarnação de meu
marido a 19 de novembro de 1990, fui chamada, cerca de quinze dias depois,
por Dr Bezerra de Menezes para a tarefa de aglutinar colegas e formar a
AME-Brasil. A partir daí começou uma outra etapa na minha vida, porque
fiquei mais ligada ao movimento médico-espírita, sem, no entanto, abandonar
nenhuma das tarefas a que estava anteriormente vinculada.
Como
surgiram as AME’s no Brasil e no exterior?
Em fevereiro de 1990, assumi
a presidência da Associação Médico-Espírita de São Paulo, que atravessava
naquele momento um período de muita turbulência espiritual. Chico Xavier
veio em meu auxílio, por ocasião de uma das minhas visitas a Uberaba,
dizendo-me para eu ter paciência, que o Dr. Bezerra iria me ajudar, porque
uma falange negativa havia se postado contra a AME, tentando impedi-la de
realizar importante tarefa que lhe estava reservada dentro do movimento
espírita.
No começo de 1990, dos nove
elementos da Diretoria, ficamos reduzidos a apenas dois e a freqüência não
passava de meia dúzia de colegas, se tanto. Chico foi nosso grande
sustentáculo nessa fase difícil. No final de 1990, como já me referi, dia 19
de novembro, meu marido partiu, aos 68 anos, vítima de câncer. No início de
dezembro, Dr Bezerra de Menezes conclamou-me para a tarefa mais ampla a que
Chico se referira e que só a partir de então tomei conhecimento, a de
chamar os colegas para a fundação da Associação Brasileira que aglutinaria
todas as AMEs. E que eu deveria me empenhar para a fundação das AMEs nos
Estados, porque era chegada a hora. Disse-me o nosso Patrono que a
Associação já estava formada no coração de Jesus e que nós precisávamos materializá-la
na Terra. E assim foi feito. Iniciamos, em 1991, com vistas à concretização
desse projeto, o primeiro Congresso da AME-São Paulo, no Anhembi,
conclamando os colegas de todos os Estados para a fundação das AMEs. No
Terceiro Congresso, em 1995, dia 17 de junho, com 9 AMEs já formadas,
fundamos a AME-Brasil. Estamos completando, em 2010, 15 anos de fundação
com 40 AMEs em funcionamento.Além do nosso site (www.amebrasil.org.br) trabalhamos
agora em nossa Revista virtual, que será lançada em comemoração aos 15
anos. Vários livros foram publicados e outros estão sendo planejados para
publicação em breve. A cada dois anos temos o MEDNESP – o congresso
nacional que congrega todas as AMEs. O de 2011 será em Belo Horizonte, no
feriado de Corpus Christi.
Em junho de 1999, com
representantes de seis países – Argentina, Brasil, Colômbia, Guatemala,
Panamá e Portugal – fundamos a AME-Internacional.
Desde 2001, eventos são
realizados com a participação dos médicos da AME que integram os diferentes
países. Hoje, além das AMEs fundadoras, temos AME-EUA, AME-Cuba, AME-Suiça.
E outras mais em vias de fundação.
No
Brasil e no exterior como vão as atividades dessas associações?
As AMEs do exterior têm
procurado realizar eventos e manter sites.
No Brasil, cada AME tem sua
característica própria e se dedica com mais afinco a determinadas tarefas.
Mas todas elas são dinâmicas e tem produzido muitos eventos, cursos,
seminários, livros, visando difundir o paradigma médico-espírita.
Em alguns Estados, há também
parcerias muito interessantes entre os centros espíritas e as AMEs com
vistas às pesquisas da Terapêutica Complementar Espírita e também em
tarefas de auxílio aos irmãos carentes.
O
trabalho tem sido reconhecido pela comunidade cientifica?
Já avançamos muito, mas a
mudança de paradigma se faz de maneira lenta, gradual. Ela é, no entanto,
inevitável.
A construção da
Espiritualidade na Medicina veio para ficar.
Aos poucos, os preconceitos
vão sendo vencidos e os novos conceitos passam a ser incorporados pela
maioria das instituições de saúde, beneficiando em muito a vida no planeta.
Mas é preciso paciência. E, sobretudo, tolerância e compreensão, porque,
como dizia Einstein, é mais fácil quebrar um átomo do que um preconceito.
De
que forma tem se organizado para dar conta de tantas atividades?
Tenho dois filhos
maravilhosos, que respeitam o meu ideal de vida. E o mesmo posso dizer da
minha norinha e dos meus netos. O nosso entendimento familiar me permite,
hoje, ampla liberdade de agir. Aliás, sempre usufruí de liberdade, desde
que meu marido estava entre nós, mas com a sua desencarnação, em 1990, e a
emancipação de meus filhos, é natural que eu tenha muito mais tempo hoje
para dedicar-me ao que considero meu ideal de vida.
De 1963 a 1990 dediquei-me inteiramente ao exercício da Medicina, à minha família e às atividades do
Grupo Espírita Cairbar Schutel (GECS), tanto em Diadema como em São Paulo,
Nesse mesmo período, estive envolvida com as tarefas da Associação
Médico-Espírita de São Paulo e as da Folha Espírita, mas nestas duas
instituições, até 1990, minhas obrigações eram menores.
A partir da desencarnação do
meu marido, em 1990, passei a ser inteiramente responsável pela Folha
Espírita, até que em 2004 um grupo de companheiros do GECS, de grande garra
e competência, assumiu comigo o ideal do nosso jornal. Também foi a partir
de 1990 que fui chamada pela Espiritualidade, em particular pelo Dr. Bezerra de Menezes, para a formação da AME-Brasil, o que veio a se
tornar realidade em 1995. Em 2000, o Dr. Sergio Felipe de Oliveira assumiu a AME-São Paulo, e, em 2006, foi a vez do colega Rodrigo Bassi, que a tem dirigido com grande competência, desde então.
Tudo se tornou bem mais amplo
para mim a partir de 1999 com a fundação da AME-Internacional e as idas
freqüentes ao exterior, desde 2.001.
Tento me organizar para
prosseguir com as tarefas do GECS, do Lar do Alvorecer, da Folha Espírita,
da AME-Brasil e Internacional.
E também cumprir a minha
parte nos programas da rádio Boa Nova – Diálogos Médicos – e da TV,
Portal de Luz.
Como é natural, só posso
dirigir essas instituições com a contribuição da comunicação cibernética.
Tenho de dar conta de dezenas de e-mails por dia, entrevistas, gravações
semanais, e tudo isso costurado com as minhas freqüentes viagens de
divulgação do ideal médico-espírita.
Para isso, não tiro férias,
trabalho muito nos feriados, e raramente tenho outra atividade que não seja
doutrinária. Não creio, no entanto, que esteja fazendo algo que me distinga
dos demais companheiros de ideal espírita, sinceramente, acho que faço
pouco; deveria me empenhar mais. Sempre gostei de trabalhar e agora me
sinto muito feliz, porque estou ligada ao que realmente gosto de fazer.
Como
tem sido a aceitação do trabalho da AME no exterior?
Creio que a linguagem
médico-espírita está mais voltada ao braço científico da Doutrina, por isso
tem sido bem aceita por nossos irmãos do exterior. Todos nós sabemos a
dificuldade que é divulgar o Espiritismo em outros países, e isto se dá
principalmente porque não há aceitação do movimento da forma como é
organizado no Brasil. Temos de compreender que são culturas diferentes. Os
europeus, por exemplo, tem desgostos profundos com seitas e religiões, por
isso são arredios a quaisquer apelos nesse sentido. E, infelizmente,
incluíram também nessa rejeição as lições do Cristo, daí a dificuldade de
aceitar o modo brasileiro de viver o Espiritismo. Eles não gostam de
pregação no velho estilo, daquele que lhes pareçam lavagem cerebral,
imposição de idéias sem discussão. O modo como os médicos das AMEs
apresentam as palestras tem agradado, porque primeiramente nós levamos a
argumentação científica, chamando à razão, e depois tiramos a conclusão
religiosa. Há também um gosto apurado para pesquisas e estas são muito
diferentes das que foram realizadas no século XIX. E é justamente nelas que
as nossas AMES tem procurado se esmerar.
Nós temos de compreender que
a cultura brasileira não é assimilada por eles, é muito diferente. Se
levarmos isto em consideração o sucesso da Doutrina será bem maior, porque
a fé raciocinada é algo imperativo para as outras culturas. E nós devemos
fazer de tudo para respeitar.
Quais
as atividades programadas para 2010?
Iniciamos com a comemoração
dos 100 anos de Chico, em Lisboa, no dia 2 de abril, em parceria com o Grupo Espírita Batuira, de Algés.
Dias 29 e 30 de maio teremos
as Vas Jornadas de Medicina e Espiritualidade em Lisboa, dias 5 e 6 de
junho, o 3º. Congresso Francofônico em Liège, Bélgica, e dias 11,12, 13 de
junho, o 3º. Congresso de Medicina e Espiritualidade dos EUA, em
Washington.
No segundo semestre: 29 e
30/10 em Amsterdam, I Congresso de Medicina e Espiritualidade da Holanda,
dias 6 e 7 de novembro, o III Congresso de Medicina e Espiritualidade da
Suíça, e dias 13 e 14 de novembro, em Bonn, teremos o III Congresso
Alemão.
E o
dia-dia da senhora na Casa Espírita?
Sempre que estou em São
Paulo, procuro estar presente às nossas atividades no Grupo Espírita
Cairbar Schutel. Faço atendimento fraterno às segundas-feiras, breve
explanação de textos de O Evangelho Segundo o Espiritismo e O Livro dos
Espíritos, como aprendi com o Chico em Uberaba. Há também neste dia o
trabalho de psicografia; às terças-feiras temos cursos, às quartas-feiras
desobsessão, e às quintas cursos. Outros irmãos e irmãs de ideal auxiliam
também com outras atividades nos mesmos dias e nos demais dias da semana.
Só não temos tarefas na Casa aos domingos.
Neste ano, completo 50 anos
de exercício das faculdades mediúnicas de psicofonia e psicografia, mas na
minha cabeça parece que iniciei ontem .
Poderia
nos falar de sua convivência com Chico Xavier?
Conheci
Chico em outubro de 1958, às vésperas da sua mudança para Uberaba, o que
veio a ocorrer em janeiro de 1959. Ele pediu ao meu colega de Faculdade,
Waldo Vieira, que me levasse até ele, porque precisava conversar comigo.
Durante a entrevista, como não o conhecia, apenas havia lido suas
obras, fiquei muito admirada com o convite que me fez, o de trabalhar
com ele nas sessões públicas da Comunhão Espírita Cristã, a partir de
janeiro, quando ele já estivesse instalado definitivamente em Uberaba. E
foi o que aconteceu. Durante cerca de quatro anos, de janeiro de 1959 a dezembro de 1962, trabalhei com ele, dando minha pequena parcela de contribuição na
interpretação dos textos de O Livro dos Espíritos e de O
Evangelho Segundo o Espiritismo, obras que eram estudadas nos dias de
sessão pública.
Neste
encontro, em 1958, ele me deu detalhes de um trabalho assistencial que
fazíamos, às quartas-feiras, nos arredores do bairro da Abadia em Uberaba.
Éramos um pequeno grupo – Ligia Alonso Andrade, “seu” Lázaro, de saudosa
memória, que segurava o lampião no ombro para nos iluminar, porque na parte
do bairro que visitávamos não havia luz elétrica, e mais um ou dois
companheiros esporádicos. Como não conhecia bem de perto a mediunidade de
Chico, fiquei espantada com os detalhes que ele me deu da nossa
peregrinação das quartas-feiras. Ele só podia ter acompanhado em espírito
para saber de tanta coisa.
Mesmo
tendo me mudado para São Paulo, em 1963, nossa amizade permaneceu sempre a
mesma, até a sua desencarnação, em 2002. Como somos imortais, com certeza
perdurará por toda a eternidade. Guardo deste período da minha vida, as
mais gratas lembranças. Fui profundamente marcada por sua bondade, por sua
humildade genuína. Por isso mesmo, reconheço a enorme distância que nos
separa do ponto de vista espiritual e a grande responsabilidade que assumi
por ter trabalhado com ele e tomado conhecimento de sua obra.
Qual
a dimensão que enxerga na obra psicográfica de Chico Xavier no contexto da
Doutrina Espírita?
A produção psicográfica de
Chico Xavier ampliou os ensinamentos de Allan Kardec, acrescentando as
revelações que não poderiam ser feitas no século XIX. Com Emmanuel, nós
temos os desdobramentos das lições abordadas pelo Mestre Jesus e Seus
Discípulos, comentadas pelo Codificador no importante livro de sua autoria
- O Evangelho Segundo o Espiritismo -, obra monumental que se
constitui em uma estaca profunda na construção do edifício do Reino dos
Céus na Terra. Como Emmanuel fez parte da plêiade de espíritos que
trabalhou à época de Kardec, ele continuou no século XX a analisar os
ensinamentos evangélicos e trouxe também algo muito importante - revelações
no campo da ciência. Apenas para citar, veja-se o quanto há de ciência nos
livros Pensamento e Vida e A Caminho da Luz.
André Luiz devassou o mundo
espiritual. Trouxe os desdobramentos já antevistos por Kardec no livro O
Céu e o Inferno e na coleção da Revista Espírita com os inúmeros
depoimentos de desencarnados, que ele colecionou em sua pesquisa
criteriosa, aplicada no século XIX.
Junto com as informações
sobre a vida no além, André Luiz trouxe também as inúmeras revelações
científicas que estão sendo comprovadas depois de décadas de informação. Os
livros de sua coletânea trazem revelações científicas importantes quanto à
natureza da luz e de sua participação na formação dos corpos físicos e
sutis; informa sobre o funcionamento das células e dentro delas o papel das
mitocôndrias; do mesmo modo expõe o papel neuroendócrino da glândula
pineal; traz indicações importantes quanto ao funcionamento do nosso
cérebro; desvenda a ação da mente – pensamentos e sentimentos – sobre o
nosso organismo; o modo como a mente pode atuar sobre o genoma e modificar
a conta do nosso destino para o bem ou para o mal; elucida a evolução do
ser humano em dois mundos – o material e o espiritual – ao longo de bilhões
de anos, etc, etc.
A revelação espiritual
tanto na obra de Kardec quanto na de Chico Xavier – Emmanuel é dedicada ao
ser humano integral. Em ambas a ciência vem imbricada à fé. Não há como
separar.
Assim, encontramos as
revelações científicas nas obras de André Luiz, integradas, perfeitamente,
às descrições das paisagens e vivências no mundo espiritual. Há muitas
revelações científicas a serem estudadas nesta obra magnífica. Muitas delas
feitas há 50 ou 60 anos, mas que somente agora a ciência está comprovando,
através de pesquisas. E há muitas mais a serem constatadas, conforme vem
investigando os membros das Associações Médico-Espíritas do Brasil.
A
AME tem alguma programação alusiva à comemoração do Centenário de
Nascimento de Chico Xavier?
Já tivemos a primeira
comemoração nos dias 2 e 3 de abril, em Lisboa, dois dias inteiramente
dedicados às lembranças de Chico e de Isabel de Aragão, sua protetora.
O programa Portal de Luz nas
4 edições de abril também foi inteiramente dedicado a Chico. O mesmo
fizemos – Dr Marco Antonio Palmieri e eu mesma - nos programas da Radio
Boa Nova – Diálogos Médicos, durante o mês de abril.
O III Congresso de Medicina e
Espiritualidade de Alagoas, que se realizará em Maceió, de 14 a 16 de maio, sob a direção de Ricardo Santos, nosso colega, presidente da AME-Alagoas, será
inteiramente dedicado ao Centenário de Nascimento de Chico Xavier.
Assim também, teremos em
S.Paulo, nos dias 4 e 5 de dezembro, as Jornadas de Medicina e
Espiritualidade da AME-SPaulo, em homenagem ao querido Chico.
ISMAEL GOBBO . Algo mais que
queira acrescentar?
MARLENE NOBRE.
Gostaria de dizer que relutei muito em abrir o coração e responder tantas
perguntas sobre mim mesma, porque estou muito longe de merecer o carinho e
a confiança dos amigos da seara espírita. Somente me decidi, quando me
fixei no título da entrevista: Trabalhador Espírita. Sim, isto eu quero
ser. Não vejo em mim nenhum mérito, mas há algo que eu luto por alcançar,
ser servidora do Mestre Jesus e de Kardec, dentro do pouco que posso
oferecer.
Agradeço a paciência dos que
leram os meus singelos arrazoados até aqui. Que Jesus, nosso Mestre de Amor
e Bondade, a todos nos ilumine e abençoe.
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